É incompreensível este estado de negação.
O Presidente da República de
Portugal, País democrático, dizia em outubro de 2022 que a denuncia feita por
quatrocentos (400) de vós não era muito comparado com o que se passa “lá
fora”. Para o PR de Portugal vós, abusados, sois poucos para serem
admitidos como vítimas desse crime hediondo, que é a violação sexual de
menores. Num país que se diz maioritariamente católico, “só”
quatrocentas e tal denúncias, não preenchem quantitativamente os pressupostos
do crime par o PR. E, pelos vistos, para a hierarquia da igreja.
Esta aparente gafe do PR,
haveria, contudo, de ter consequências nefastas, como se veio a verificar com a
divulgação do relatório elaborado pela “Comissão Independente para o Estudo
de Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica em Portugal”. Quase
toda a hierarquia da igreja católica de imediato tentou a desvalorização dos
casos, a insipiência das denúncias, a fragilidade das provas, a negação do
direito à reparação e, chegou ao ponto de se defender, «que os abusadores
poderiam receber perdão se tivessem reparado os "danos pelo mal" que
causaram». O debate ficou a este nível. Em nenhum dos intervenientes,
bispos e cardeal, se ouviu a palavra vítima. E quando a pronunciaram, foi quase
sempre em tom de desvalorização.
Muita gente estranha que sendo
estes crimes de natureza pública, porque que é que até agora os agentes da
justiça em Portugal não se pronunciaram, pelo menos com a gravidade que o caso
merece? Ministra da Justiça, Procuradora-Geral da República, Diretor da Polícia
Judiciária, etc., etc. "No pasa nada”?
É triste, mas é verdade. Mas quem
deu força a uns e fraqueza a outros foi a fala do PR. Este com a sua
autoridade política deu o mote, para dentro e para fora da igreja. Resta,
pois, a revolta dos abusados. E esta tem de se realizar, sem exposição, com a
defesa intransigente da sua privacidade e dignidade. Mas os abusadores, não
gozam dos mesmos direitos. Estes têm obrigação de se sujeitar a um julgamento
público, tal com acontece a todos os que praticam crimes. Dir-se-á que os
crimes prescreveram. Será assim? Ainda não ouvimos os responsáveis pela justiça
em Portugal, sobre este assunto. Sentir, que o Estado de Direito Democrático
está presente e vigilante em casos tão graves como os denunciados, seria uma
prova de proteção da sociedade e um sinal inequívoco de rejeição das práticas
denunciadas. O silêncio envergonhado dos agentes do Estado Democrático, perante
os crimes realizados na igreja católica, contraste com a sua predisposição para
participar em eventos engalanados com dinheiros públicos.
O pior que pode acontecer (e aconteceu), é a amputação da dignidade humana.
Este é, seguramente, um crime
sem perdão !...