sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Governo forte, com aliados fortes!


Em entrevista à TVI, António Costa (AC), secretário-geral do PS disse que é absolutamente impossível existir uma coligação formal de governo à esquerda na próxima legislatura e reconheceu que os portugueses não gostam de maiorias absolutas. Ou seja, (AC), não quer ministros do Bloco de Esquerda e do PCP no Governo, caso o PS vença as eleições, claro.
Dito desta maneira, parece que Costa não afasta uma coligação formal de governo à direita ou, pelo menos, com o PSD. É certo que em maio deste ano, Costa rejeitava a solução “bloco central”, afirmando “que a governação conjunta de PS e PSD "empobrece a democracia". Sobre isso, aparentemente, parece que todos estão de acordo. Mais, a solução governativa encontrada por Costa, nesta última legislatura, mostrou-se razoavelmente eficaz. Mas como deverá ser aprofundado o debate político, para que a solução que resulte das próximas eleições legislativas de outubro, possa criar condições efetivas para enfrentar os grandes desafios da sociedade portuguesa, como sejam o da pobreza estrutural, o da precariedade do emprego, o da redistribuição justa e equilibrada da riqueza produzida, a elevação dos níveis de escolaridade dos portugueses, o combate efetivo às assimetrias nacionais, regionais e locais, dando prevalência ao modelo da regionalização, o combate sem tréguas à corrupção, com uma nova cultura jurídica da investigação, onde possa voltar a funcionar o princípio in dúbio pro reo, o que pressupõe, a chamada efetiva à justiça de suspeitos da prática de crimes e não este espetáculo indecoroso de permanentemente os “suspeitos” se encontrarem em “banho-maria” na imprensa, com a narração de “factos” que não se conhece a origem, mas que alimentam sofregamente estes veículos e geram na opinião pública um sentimento, verdadeiro, de impunidade, parcialidade, amiguismo, partidarismo, encobrimento e até colaboração disfarçada ou expressa entre poderes, políticos e magistrados e, o grande poderoso, poder económico. Acabar com os megas processos, é uma lição a tirar deste passado recente. Tudo isto é feito, com a aparência de legalidade e normalidade, numa ofensa expressa a todos os cidadãos, numa sociedade que cada vez se apresenta mais doente e, por isso mesmo, gere o aparecimento de novos “curandeiros” e “pastores”, todos eles portadores de mensagens de natureza discriminatória, o que fere o princípio da igualdade, como distinção, exclusão, restrição ou preferências, motivado por raça, cor, sexo, idade, trabalho, credo religioso ou convicções políticas. O clima internacional a isso é propício.
Em outubro, portanto, terá de haver um governo forte, com aliados fortes, para combater estes “fungos” e, terminado o ciclo, pós-troika, estruturar a política e a governação para as grandes questões nacionais, que urge fazer. Enfrentar os lóbis com coragem e determinação, denunciar atempadamente as pessoas e organizações que minam o tecido social, ter uma política pública de saúde exigente e sem tibiezas, enfrentar o sistema de educação, como a prioridade das prioridades, chamando à participação de boa-fé todos os agentes que participam no processo educativo, não criando clareiras e/ou vazios que possam ser ocupados por oportunistas e profissionais do caos; colaborar ativamente com o mundo do trabalho, dinamizando a concertação social, fomentando o respeito pelas leis e convenções estabelecidas e arbitrando conflitos potenciais ou emergentes, tomando a iniciativa, não só no sector da sua responsabilidade, como em todo o restante mundo do trabalho; ter uma política ativa de promoção da habitação, em todo o território nacional, para isso colaborando de boa-fé com todas as autarquias, com vista a eliminar a pobreza de habitação que ainda se encontra um pouco por todo o país; eliminar o flagelo da falta de água, luz e comunicações em muitas das habitações em Portugal; dar prioridade aos pobres, às crianças, aos velhos, e aos mais desfavorecidos, nas políticas públicas a implementar pelo governo saído das eleições de outubro é um imperativo nacional, que só um governo forte, com aliados fortes, poderá concretizar. Estes são desígnios da esquerda, e fazem parte da matriz dos partidos da esquerda.  Há que concretizá-los.

P.S.: O dinheiro para isto tudo? Depois da prevalência da canalização de recursos financeiros do Estado (a) para o sector bancário e financeiro, qualquer coisa como vinte e quatro mil milhões de euros; (b) para os benefícios fiscais às empresas, pelo menos em cerca de ¼ e (c) para a manutenção de algumas subvenções partidárias, que deverão ser drasticamente reduzidas exemplos de entre outros), creio que é possível iniciar o percurso de uma sociedade mais justa, mais igualitária e mais solidaria, desviando agora esses recursos para estes fins. Permitir bolsas de riqueza, perfeitamente escabrosas, num país com taxas de pobreza como o nosso, em especial, nas crianças e nos idosos, é uma afronta à dignidade e aos valores inerentes à condição humana.



quarta-feira, 7 de agosto de 2019

O contrassenso ou a mentira piedosa? (Os fins nunca justificam os meios)


Ontem, em futebol, jogou-se a supertaça Cândido de Oliveira, entre o Benfica e o Sporting. Ganhou o Benfica, por uns expressivos 5 (cinco) a zero. Dir-se-ia que as hostes benfiquistas rejubilaram de alegria e festa por mais esta conquista tão motivadora para início de época. Porém, alega-se que não foi assim. Miguel Albuquerque, diretor das modalidades leoninas, disse ter sido atacado por 15 adeptos do Benfica no final da Supertaça. Segundo ele, quando se dirigia para o seu carro, foi cobardemente atacado por cerca de 15 adeptos do Benfica devidamente identificados com camisola desse clube, que ao me reconhecerem avançaram em grupo desferindo vários murros na cabeça, socos e pontapés. Por esta descrição, os adeptos do Benfica afinal não estavam felizes mas com raiva por terem ganho ao Sporting e logo por cinco a zero. É incompreensível, não é? É facto que o adepto nem sempre racionaliza os seus atos. É facto também que os adeptos do Benfica ou do Sporting em dérbi, não são das pessoas mais amistosas. Em regra, os adeptos da equipe que perde “verbalizam” as suas frustrações ou a frustração da derrota, em atos impensados. Também é verdade que alguns adeptos da equipe que ganha nem sempre sabem comemorar de forma civilizada a vitória. Tudo isto vem nos livros.

Já é estranho, muito estranho, que alguns adeptos da equipe categoricamente vencedora, alegadamente tenham partido para a agressão física de um diretor das modalidades da equipe vencida, a pretexto da vitória. É surreal, no mínimo …!

Menos surreal, muito menos, foi o que eu ouvi hoje à hora do almoço, da boca do empregado de mesa, um indefetível Sportinguista, de reação à derrota. “Sabe, p’rá quela gente era uma decisão sumária, tipo Alcochete. Quais Bas Dost, é tudo a chupar …”. Não reproduzo na íntegra, porque não é relevante. Apenas demonstra a deceção do adepto do Sporting, perante tão copioso derrota e, mais que isso, o sentimento de que essa responsabilidade é da atual direção e dos jogadores (alguns?). Este comentário, que é parte de um comentário maias vasto, realmente, contém alguma “violência” verbal que, se se ficar por aqui, nenhum mal traz ao mundo. Pior é quando esta “violência” verbal é o rastilho para a violência física, com atos de vandalismo, inaceitáveis.

Devem as autoridades, em tempo, investigar o que se passou e sinalizar os autores dos crimes que foram cometidos. Hoje, com os meios ao dispor, sistemas de videovigilância e outros, é possível com alguma rapidez chegar aos autores dos ilícitos penais e afastar de vez (ou não) a suspeição que recai sobre adeptos do Benfica. O facto de os autores das agressões, como diz a vítima, estarem devidamente identificados com camisola desse clube, não prova que sejam adeptos do Benfica, assim como um grupo de criminosos vestidos de polícias, roubaram 720kg de ouro no aeroporto de Guarulhos, Brasil, e hoje sabe-se que não eram polícias.


sexta-feira, 2 de agosto de 2019

A Lista de Candidatos


 Deverá ter terminado o processo interno nos partidos da escolha de candidaturas a deputados para as próximas eleições legislativas que se deverão realizar em outubro deste ano. Seria muito importante que os partidos se preocupassem com cada um dos seus candidatos escolhidos, designadamente, em matéria de honorabilidade, integridade, honradez, consciência do interesse público, vocação politica, disponibilidade integral para o cargo, etc., etc.

Não se justifica a menorização do Estado de direito democrático através da escolha de representantes de fraca qualidade e muitas vezes de honorabilidade duvidosa. Os partidos até aqui têm dado mais importância à ligação do candidato ao partido e ao seu grau de subserviência quase cega ao “apparatchik”. Isto é patente no processo interno de escolha de candidatos, que é, em regra, uma luta “fratricida” por um lugar protagonizada pelos candidatos e as direções partidárias, que pretendem assegurar (salvo o exagero), o «pensamento único».

Por isso a democracia empobrece, em cada eleição que passa. Por isso os eleitores se desmotivam e as taxas de participação tendem a refletir este estado de coisas. Está na hora, de novo, de os partidos deixarem de olhar para dentro e preocuparem-se seriamente com o país. Está na hora de haver mais rigor na escolha dos candidatos que sejam garantes da democracia de qualidade para todos e não de indivíduos que usam a democracia para a sua degradação senão mesmo denegação.  

Se os partidos forem exigentes nas escolhas, como devem ser, previnem a proliferação de “verbos de encher” que pouco ou nada têm contribuído para o crescimento da nossa democracia, como se tem visto ao longo destes anos. As “maças podres” devem ser retiradas do cesto antes que contaminem as restantes.

Não faltam exemplos de, por pura tática político-partidária, o país ter sido representado por indivíduos que no parlamento, no governo, nas autarquias, etc., mostraram não ser dignos do mandato que o povo lhes tinha confiado, agindo em muitos casos, contra os interesses do seu próprio país.

Quarenta e três anos depois das primeiras eleições legislativas livres e democráticas, após o 25 de Abril de 1974, das quais saíram um conjunto de tribunos e governantes de estirpe elevada, é hora de devolver ao povo e à democracia portuguesa essa qualidade perdida.

Esta é uma exigência que, em primeira linha, é da responsabilidade dos partidos.




quinta-feira, 1 de agosto de 2019

“Faits divers”


À medida que alguns países importantes na cena europeia ou mundial se vão ridicularizando através dos líderes que escolhem, dando mostras que os povos estão a atingir um estado de negação politica nunca visto, caminhando para um abismo sem retorno e de consequências já mais previsíveis de guerras e catástrofes humanitárias, nós por cá, destapada a tampa, assistimos ao ressurgir de um neoliberalismo de pacotilha, ou seja, pessoas e/ou organizações que defendem um conjunto de ideias políticas e económicas capitalistas como, por exemplo, a não participação do estado na economia, liberdade total do comércio, para garantir o crescimento económico e o desenvolvimento social do país.

Estes arautos neoliberais afirmam que o estado é o principal responsável por anomalias no funcionamento do mercado livre, em virtude do seu peso e tamanho constrangerem os agentes económicos privados. Reclamam, por isso, a pouca intervenção do governo no mercado de trabalho, a política de privatização de empresas do Estado, a livre circulação de capitais internacionais, a globalização, a abertura da economia para a entrada de multinacionais, a adoção de medidas contra o protecionismo económico, a diminuição dos impostos e tributos excessivos etc.

No fundo, estes nossos neoliberais são saudosistas. São saudosistas da troika e do governo de Passos Coelho; são saudosistas da “pobreza regeneradora”, do assistencialismo, da venda ao desbarato de empresas públicas enfim, de um Portugal do passado.

A principal diferença entre os nossos neoliberais e os outros, é que os nossos pretendem manter uma reserva pública, para exercer o seu múnus. Eles querem continuar a ter empregos no sector público, nas empresas públicas, nos institutos públicos, nas empresas municipais, etc. São gente que defende (?) a pouco intervenção do governo no mercado de trabalho, mas sempre com a ideia de uma reserva pública de emprego, que lhes possa isentar do mercado privado de emprego, apesar de tudo sujeito ao escrutínio de alguma competência ou, se assim não for, de alguma utilidade.

O exemplo mais definitivo é o de Passos Coelho. Saído da política, onde fez carreira desde pequenino, buscou guarida no sector público de emprego, com a vantagem excecional, tipo “honoris causa”, de lhe ser dado um lugar equivalente a professor catedrático. É obra! Aqui, Rui Rio “passa-lhe a perna”. Quando fez um intervalo na política, foi trabalhar para uma empresa privada na área de gestão de recursos humanos. Fez jus à sua condição de social-democrata de raiz liberal na economia.

Outros há, como o historiador Rui Ramos, que defendem o aparecimento de uma “maioria reformista”, que liberte Portugal de uma nova “geringonça”. Este “reformador”, neoliberal de encarnação, sustenta-se no emprego público, para difundir as suas ideias e ganhar notoriedade para a acumulação de outras atividades, remuneradas, naturalmente.

Como alguém dizia, “Em Portugal, a direita afirma-se obsessivamente liberal apenas na cruzada contra o poder fiscal e a ação regulatória, ainda quando esta última visa garantir uma maior transparência e equilíbrio económico, social e ambiental. Ao revés, sempre foi em geral muito amiga do orçamento e do Estado quando estes apoiam interesses parasitários, distorcendo o mercado, por via de subsídios ou de outros instrumentos protecionistas, segundo o velho princípio — privatizem os benefícios e coletivizem os prejuízos.

Essa é que é essa…!

quinta-feira, 18 de julho de 2019

“TURBATIO SANGUINIS” (Confusão de Sangue)



Os deputados aprovaram no passado dia 11/07/2019, em votação na especialidade na comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, o fim do prazo imposto pela lei para casar segunda vez, após um divórcio ou viuvez. Assim, a partir da entrada em vigor da nova lei, vai ser possível casar logo após o divórcio. A proposta aprovada teve os votos favoráveis do PS, do BE, do PAN, do PSD e do PCP. O CDS votou contra.

O prazo internupcial atualmente previsto no Código Civil (art.º 1605.º) impede o segundo casamento num prazo de cento e oitenta dias após o divórcio ou viuvez, no caso dos homens, e de trezentos dias no caso das mulheres (180 dias se apresentarem um atestado médico em como não estão grávidas), uma disposição que consta da lei desde 1966.

Os prazos internupciais consagrados no nosso ordenamento jurídico são um impedimento impediente, o que significa que para que o segundo casamento se possa realizar tem de ser respeitado um determinado período de tempo. Assim, qualquer um dos cônjuges que viu o seu casamento dissolvido por morte ou divórcio, declarado nulo ou anulável, tem de respeitar um prazo legal antes de ser autorizado a celebrar um novo casamento. Contudo este é diferente entre homem e mulher, como se viu: ao primeiro aplica-se um prazo de cento e oitenta dias, à segunda de trezentos – arts. 1605º, nº 1 do Código Civil e 1604º, al. b), do mesmo Código

As razões que o sustentam são essencialmente duas: em primeiro o “tempus lugendi”, ou seja, um período de “luto” de cento e oitenta dias que a lei impõe a ambos os cônjuges para fazer respeitar o que se pensem ser as convenções sociais e em segundo a pretensão de evitar a “turbatio sanguinis”, ou seja, as dúvidas que poderiam suscitar-se sobre a paternidade de um filho nascido depois do segundo casamento.

Ora, os deputados, tendo em conta toda a evolução histórica, social e legislativa já vivida no nosso ordenamento, por maioria qualificada puseram fim ao referido prazo internupcial, permitindo umas segundas núpcias a qualquer um dos cônjuges que viu o seu casamento dissolvido por morte ou divórcio, declarado nulo ou anulável.

Competindo ao Estado regular todos os aspetos relacionados com a proteção da família, enquanto elemento fundamental da sociedade contemporânea (art.º 67.º, n.º 2, da CRP), essencial seria que se resolvessem as distorções constitucionais que o prazo internupcial, inevitavelmente, ia criando.

Na verdade, o prazo internupcial sempre suscitou a dúvida se não colidiria com os princípios constitucionais, como sejam a igualdade dos cidadãos, o direito a celebrar casamento e até mesmo o direito a constituir família, princípios que aparentam estar de certo modo “abalados” pela essência e pelo resultado deste prazo. O instituto da filiação, o modo de estabelecimento da paternidade, o momento da conceção, o tempo de duração máxima e mínima da gravidez, a impugnação da paternidade e até os meios de prova admitidos na investigação da mesma, são todos eles, e a sua utilidade prática, postos em causa com a existência do prazo internupcial.

Por sua vez, o artigo 26.°, N.º 1 da Lei Fundamental garante a todos os cidadãos o direito à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação. E o n.º 1 do artigo 36,°, é claro ao afirmar que todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade.

Nesse sentido, o prazo internupcial, tal como está hoje estabelecido no Código Civil, parece não respeitar, de todo, aqueles preceitos constitucionais, porquanto permite aplicação de um prazo mais dilatado para as mulheres e com consequentes consequências quando desrespeitado. Tudo em situações em que não são justificáveis e que parecem apenas se encontrar explicação numa forma de discriminação em função do sexo. O que é igualmente violador do princípio da igualdade, artigo 13.º da Constituição.

Por tudo isto, Portugal venceu mais uma barreira na luta pela igualdade de direitos e de tratamento entre mulheres e homens e, como alguns assinalam, Portugal chegou finalmente, também neste capítulo, ao século XXI, já que estávamos 38 anos atrasados em relação a Espanha e 14 relativamente a França.

Não fazia qualquer sentido manter um prazo internupcial que permitia aos homens voltarem a casar-se imediatamente a seguir a um divórcio mas obrigavam a mulher a esperar 300 dias para o fazer. Uma regra baseada numa visão paternalista e patriarcal das mulheres, que lançava uma constante suspeição sobre elas e que lhes limitava a liberdade e a autodeterminação, no dizer de Sandra Cunha, deputada do BE e autora do projeto-lei.


quinta-feira, 4 de julho de 2019

"Lamento que chamem geringonça ao Governo do meu país.” (Coronel Costa Braz - "Capitão de Abril")



Na passada segunda-feira (01/07), morreu o historiador e jurista de mérito António Manuel Hespanha. O Professor Hespanha foi um democrata convicto e um homem de ideais e saberes. Todos aqueles, como eu, que tiveram o privilégio de receber os seus ensinamentos, estar-lhe-ão sempre gratos. Aliás, as manifestações públicas que recebeu, são a prova de que estávamos perante alguém de exceção. É, pois, uma perda irreparável.

Na terça-feira (02/07), morreu um homem de Abril, o Coronel Costa Brás.
Costa Braz fez parte do grupo que preparou o 25 de Abril e, posteriormente, do Grupo dos 9, que normalizou a democracia em Portugal no verão de 1975. O Coronel Costa Brás, foi o primeiro Provedor de Justiça português, tendo assumido durante uma década, entre 1983 e 93, o cargo de Alto-Comissário contra a Corrupção.
Também neste caso tive o privilégio de conhecer pessoalmente o Coronel Costa Brás, de quem tenho gratas memórias e, como Português, estou infinitamente grato pelo que ele fez pela instauração e consolidação da democracia em Portugal. Como homem e militar que se dedicou à causa pública, o país só tem a agradecer o seu contributo absolutamente desinteressado. O Coronel Costa Brás era de uma estatura impar e de uma lisura a toda a prova. Quando olhamos em redor, choca a disparidade atualmente existente entre aqueles que se servem da causa pública e aqueles, como ele, que se dedicaram de coração ao interesse público.
O Portugal atual, mais uma vez, mostra não estar à altura da grandeza destes homens de Abril, “que por obras valerosas/Se vão da lei da morte libertando …”

A minha modesta homenagem a este distintíssimo “Capitão de Abril”

sexta-feira, 3 de maio de 2019

"Cortes nos salários e pensões têm de ser «permanentes» ”



Em março de 2014, o então primeiro-ministro, da coligação “Portugal à Frente” (PàF), declarava repetidamente, a frase que serve de título a este escrito. Este aviso destinava-se a confirmar não só a política levada a cabo de cortes nos salários e pensões então em curso, bem como a redução drástica nos apoios sociais e nos serviços públicos, com particular destaque nos serviços públicos de saúde. Esta política, iniciada com programa da troika em Portugal, em 2011, levou a que muitos dos direitos sociais e laborais fossem suspensos ou até suprimidos, instalando-se a denominada “pobreza regeneradora”, tanto do agrado daquela coligação de direita que entre 2011 e 2015, foram os serventuários da dita troika, sem resultados palpáveis.

Ora, foi neste quadro, que alguns pretendem agora fazer querer que desconhecem que, a 1 de janeiro de 2011, a contagem do tempo de serviço (dos professores, e não só!) foi "congelada", situação que se manteve em 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016. Neste caso, têm sido as sucessivas Leis do Orçamento do Estado para estes anos a estabelecer estes novos "congelamentos".

E este “congelamento” tem muito a ver com a atitude do PS, enquanto percursor e protagonista da solução de governo, saída das eleições de 2015 e que nos governa atualmente. É que para o governo do PS, cuja prioridade foi a restituição de rendimentos e a reposição dos serviços públicos à população, designadamente, na área da saúde e segurança social, estes desideratos tinham que ser levados a cabo, em concorrência com as obrigações assumidas com Bruxelas, principalmente, com a redução do défice e da dívida pública. Naturalmente, que o cumprimento em simultâneo destes objetivos teria sempre, implícita uma dificuldade de raiz. Na verdade, depois de anos de estagnação e até de retrocesso, muito dificilmente seria possível cumprir os dois objetivos, totalmente incompatíveis, e sem rendimentos extras, para os satisfazer. Ainda assim, alguma coisa foi feita, para melhor. Mas longe do desejável. E é por isso, que as classes profissionais atingidas desejam recuperar todo o tempo “perdido”, nem que parar isso o governo tenha que desequilibrar a balança de Bruxelas em favor destas reposições.

Afinal, os parceiros da solução governativa existente proclamam, insistentemente, menos fundamentalismo no cumprimento das metas europeias e mais satisfação dos legítimos direitos daqueles que foram, durante anos, espoliados.

E é neste quadro, que na Assembleia da República, em sessão de ontem (02/05/2019), numa votação na especialidade da comissão parlamentar de educação e ciência, se formou uma maioria de deputados do PSD, CDS, PCP e BE, que aprovou a recuperação integral do tempo de serviço dos professores. É evidente que, mal tinha sido anunciada esta decisão da AR, logo outras classes profissionais da função pública (Magistrados, Oficiais de Justiça, militares, profissionais da GNR e da polícia marítima) reivindicaram os mesmos direitos.

O governo chama-lhe, uma “coligação negativa”. Acho que tem razão, mas não pelas razões que aduz. É de facto uma coligação negativa, já que a maioria que se formou, conta com dois partidos (o PSD e o CDS), que há menos de três anos, defendiam o corte permanente de salários e pensões e o congelamento «ad aeternum», de todas as carreiras na função pública.

A falta de credibilidade desta “maioria”, meramente conjuntural e oportunista, é a prova provada que os interesses gerais do país, por maiores e urgentes que sejam, sucumbem perante os interesses partidários, sejam eles a favor ou contra a democracia.

Uma reivindicação, aparentemente, justa, torna-se possível através de uma coligação injusta e imoral.