sábado, 10 de junho de 2023

 ASSÉDIO JUDICIAL – Parte II

PSD À PROCURA DE MORO

Depois de um simples “levantar de véu”, o caso TAP mostrou um conjunto de responsabilidades ainda não apuradas, do governo PáF, da iniciativa do PSD, na privatização da companhia em 2015, que poderão vir a ser observadas no âmbito dos crimes de responsabilidade ou noutra tipologia de âmbito criminal mais grave. Por isso, caíram como “sopa no mel” para o PSD, os episódios relativos à demissão do adjunto do ministro das infraestruturas o desvio do computador e a comunicação ao SIS. Estes passaram a ser os temas centrais da CPI de tal forma que o PSD, pretende agora apresentar queixa-crime, baseada numas alegadas falsas declarações do ministro João Galamba, com afirmações de outros governantes, sobre o envolvimento do SIS na recuperação do computador do antigo adjunto do ministro das Infraestruturas. Repare-se, que a CPI foi criada para apurar questões relacionadas à gestão, operação e eventuais irregularidades envolvendo a companhia aérea TAP. E, neste ponto, que é o objeto da CPI, já foi possível perceber (sem se conhecer, ainda, o alcance e extensão), que a privatização da TAP efetuada pelo governo do PSD em 2015, teve duas condições base à celebração do negócio com o privado. A primeira é que todas as dividas contraídas pela TAP, seriam da responsabilidade do Estado português. A segunda é que essas responsabilidades estavam refletidas em cartas de conforto assinadas pelo Estado português e entregues às instituições bancárias credoras.

Como alguém dizia, e foi convenientemente ocultado dos portugueses durante bastante tempo, “…é que as cartas conforto são a coluna vertebral da privatização. Não são um detalhe, foi o que permitiu fazer o negócio, aquele mau negócio em que o bom fica para os privados e o mau para o Estado".

Já para não falar do negócio da Airbus na TAP (um processo de capitalização feito de forma ilegal?), pelo privado escolhido pelo governo PSD/CDS.

Percebe-se, agora (bastante bem), a importância para o PSD de discutir a comunicação ao SIS, o desvio do computador e as demais peripécias do adjunto.

Só que, a menos que o PSD conseguisse arranjar um juiz tipo Sérgio Moro (Brasil), o que no nosso país não é fácil, vai ter que, mais tarde ou mais cedo, justificar muito bem aquilo que já é visto como a antecâmara de crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos, praticados em 2015, pelo governo PSD/CDS, na transportadora aérea portuguesa.

 

sábado, 13 de maio de 2023

 AS PRERROGATIVAS DE LÍDER PARTIDÁRIO

Em Portugal, as prerrogativas de líder partidário são reguladas por leis específicas sobre partidos políticos e pela Constituição da República Portuguesa. No entanto, a Constituição não faz menção explícita às prerrogativas do líder partidário. Em vez disso, a lei eleitoral e a lei dos partidos políticos estabelecem as regras e os procedimentos que regulam a atividade partidária, incluindo as prerrogativas do líder partidário. É pela existência deste vazio constitucional, que os líderes partidários determinam as suas próprias prerrogativas, interpretando e aplicando as leis secundárias às suas próprias vontades e conveniências. É o que neste momento se está a passar com o líder do PSD, Luís Montenegro.

Entre Fevereiro de 2014 e Janeiro de 2022, a sociedade de advogados de que o presidente do PSD era sócio faturou 679 mil euros em contratos com entidades públicas, designadamente, as Câmaras de Espinho e Vagos. Nada de anormal aqui se colocaria, não fosse o caso de todos estes contratos terem sido por ajuste direto e as presidências daquelas autarquias, na época, serem lideradas pelo PSD. “À mulher de César não basta ser séria…”

Mais recentemente, sai a notícia de que Luís Montenegro não comunicou ao Tribunal Constitucional, nas declarações de rendimentos e património que entregou até 2022, o valor da moradia com seis pisos que construiu em Espinho, nem de onde veio o dinheiro para a pagar. O Expresso, dedicou ao assunto uma página inteira. É certo que o candidato à liderança do PSD, em 2022, não era para Balsemão, Luís Montenegro, mas…, jornalismo é jornalismo.

Então, diz o Expresso, que “Em maio de 2016, quando Luís Montenegro apresentou à Câmara Municipal de Espinho uma estimativa de quanto iria custar a casa que pretendia começar a construir a menos de 100 metros do calçadão da Praia Azul, na zona mais nobre da cidade, o preço médio de venda de imóveis para habitação em todo o concelho rondava os €1000 por metro quadrado. O então presidente do grupo parlamentar do PSD informava a autarquia, no entanto, que estimava gastar metade desse valor na construção da sua moradia de luxo. De acordo com documentos obtidos pelo Expresso na autarquia, a moradia de Montenegro ficou com 829,6 m2 de área total de construção bruta, distribuídos por seis pisos, incluindo uma cave. Chegou a estar prevista uma piscina de 20 m2 no topo do edifício no projeto, mas o plano acabou por ser deixado de lado, tendo o último piso ficado apenas com um salão e um terraço de 40 m2. Quando o alvará de utilização foi emitido, em setembro de 2021, o preço médio de venda de imóveis no concelho (sendo que esse cálculo inclui o mercado de apartamentos modestos) já estava em €2000. Mas quanto terá custado, afinal, aquela habitação de luxo com seis pisos? Um milhão de euros? Mais? Apesar da insistência do Expresso nos últimos meses em obter uma resposta, Montenegro recusa dizer quanto gastou.”

Entretanto a tudo isto, Luís Montenegro, líder do PSD, responde: "O maior problema que encontro na política portuguesa é mesmo o socialismo, que tem gerado empobrecimento, perda de oportunidades, baixos salários, que nos tem remetido para a cauda da Europa”. “E apontou a visão estatizante do PS como a principal linha de demarcação entre socialistas e sociais-democratas

Os brasileiros dizem «Sem-vergonha». É mesmo, ora vejam:

a)       “empobrecimento” – dificilmente haverá riqueza, enquanto alguns, como o líder do PSD, se julgarem (e fazerem) no direito de ter mais do que aquilo a que têm direito; só sonegando aos outros, se consegue tal proeza;

b)       “perda de oportunidades” – como haverá oportunidades para todos se há ajustes diretos entre amigos, ainda por cima de coisa pública;

c)       “baixos salários” – como pode haver salários médios ou altos, se a economia publica ou privada é dominada por uns quantos “amiguinhos”;

d)       “visão estatizante do PS” – É curiosa esta afirmação do líder do PSD, Luís Montenegro, uma vez que, como vem demonstrado, ele é um daqueles que maiores proveitos tira desses bens públicos de uma forma até ostensivamente pornográfica.

Infelizmente, o maior problema da política portuguesa continua a ser a falta de ética, honorabilidade, prestígio e idoneidade de uma boa parte das lideranças partidária. Enquanto a política for refúgio para os incapazes, incompetentes ou “facilitadores, dificilmente o país prospera. 

terça-feira, 9 de maio de 2023

 “ASSÉDIO JUDICIAL”

O Segredo profissional do advogado

O Supremo Tribunal de Justiça rejeitou, no passado dia 03 de maio, do corrente, duas propostas relativamente ao levantamento do segredo profissional de sociedades de advogados feito pela comissão de inquérito à TAP. Este pedido inscreve-se na falência política e democrática desta CPI, que desde a primeira hora mostrou total incapacidade e competência para cumprir o objeto da Comissão ao ponto do PSD ameaçar apresentar uma queixa-crime contra o governo e/ou governantes, por desobediência qualificada, por estes se negarem a fornecer à Comissão, uma cópia de um alegado parecer que teria dado origem ao despedimento da CEO da TAP e do seu Presidente do Conselho de Administração. O líder do PSD chegou mesmo a dizer que, "Isto é uma distorção completa do equilíbrio de poderes constitucionais entre órgãos de soberania e constitui um crime de desobediência qualificada para os membros do Governo que não cumpriram a determinação da Assembleia da República e se recusam a fazê-lo de forma absolutamente inaceitável. Perante isto, os deputados do PSD na comissão de inquérito em causa vão solicitar que a lei seja aplicada. Compete ao presidente da comissão parlamentar de inquérito dar nota deste incumprimento legal ao presidente da Assembleia da República e compete a este fazer a participação ao Ministério Pública pela prática do crime de desobediência qualificada dos titulares do Ministério das Finanças, Infraestruturas e Presidência do Conselho de Ministros. Quero reafirmar que o interesse do PSD é mesmo apurar toda a verdade”.

Este é o exemplo acabado, da judicialização da política, ou melhor, do referido “assédio judicial”.

A falta de argumentos e até de interesse efetivo na análise do que se passou na TAP, leva o PSD à chicana política e ao recurso a argumentos espúrios, como seja o acesso a alegados pareceres, através dos quais o governo terá sustentado a sua decisão, esta sim, objeto de escrutínio e não os aconselhamentos que levaram à mesma. Por este caminho, qualquer dia o PSD pede a condenação judicial dos pareceristas ilibando, assim, os governos das decisões que tomam, com bases nesses pareceres. Aliás, a referida Comissão de Inquérito à TAP, tem sido um exemplo acabado, dos ataques aos pareceristas, sejam eles advogados ou outros, que na defesa dos interesses dos seus clientes/constituintes, são enormemente mal tratados como se fossem eles o cerne da questão. Ouvi até, numa das audiências gravadas, a Alexandra Reis, um deputado do PSD, que se dizia advogado, e perante a recusa daquela em dizer quais eram as pessoas na TAP, que negociavam com o seu advogado, vociferar que “era advogado há 30 anos e que as conversas com os clientes são profundas e explicam tudo o que se está a passar. O seu advogado não lhe disse com quem estava a negociar, realmente? O meu advogado disse que estava a negociar com os advogados da TAP.” Esta resposta, não satisfez o deputado, advogado. O que ele queria mesmo saber quem eram as pessoas da TAP, nome, idade e profissão, digo eu, com quem os advogados falavam. Este deputado/advogado, decididamente não sabe o que é a representação ou sabendo, está disposto a ignorá-la, para obrigar os outros a violar a lei. Logo ele, que exerce a representação em duas funções. Mas como diz Montenegro, “… o interesse do PSD é mesmo apurar toda a verdade.”

E é nesta senda que, numa aviltante subversão dos princípios constitucionais que regem a profissão de advogado, os deputados da CPI pedem ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ) o levantamento de sigilo profissional a três escritórios de advogados, com o argumento de querem conseguir ter toda a informação possível para fazer a melhor análise dos factos e por isso pedem que seja revelado o conteúdo das conversas e o teor dos documentos produzidos pelos advogados que representaram as partes envolvidas no «caso TAP».

Este pedido ao STJ é chocante, pois foi a própria Assembleia da República, órgão de soberania, que se dispôs a violar uma «cláusula pétrea» dos advogados, para encobrir a manifesta incompetência dos deputados da CPI, da sua total impreparação para os poderes investigatórios que lhe estão conferidos, a ausência de sentido de Estado e respeito pelas traves mestras do Estado de Direito Democrático, nomeadamente, a proteção dos direitos dos cidadãos, quando confiam ao advogado informações através do exercício da sua atividade profissional e na base de uma relação de confiança. Ora, radicando no princípio da confiança, no dever de lealdade do advogado para com o constituinte, o dever de segredo profissional transcende a mera relação contratual, assumindo-se como princípio de ordem pública e representando uma obrigação para com o constituinte, para com a própria classe, a Ordem dos Advogados e a comunidade em geral. Por isso, consideram-se abrangidas pelo segredo profissional todas as situações que sejam suscetíveis de significar a violação da relação de confiança entre o advogado e o seu patrocinado e também todas as situações que possam representar quebra da dignidade da função social que a advocacia prossegue.

Foi essa quebra da dignidade da função social que a advocacia prossegue, que a CPI se mostrou disposta a violar. Felizmente que o Supremo Tribunal de Justiça, estava atento ao pedido capcioso, dos deputados da CPI. Pena é, que outras entidades, como a Ordem dos Advogados (que eu saiba), não se tenham manifestado contra.

segunda-feira, 8 de maio de 2023

 “BALSEMÃO É LELÉ DA CUCA” ([1])

Enquanto o presidente Marcelo representava condignamente Portugal na cerimónia de coroação do rei Carlos III, do Reino Unido, em Portugal, um “amigo” dele, que mostra que sabe perdoar, vem ao seu auxílio, dizendo aos seus correligionários “Temos de acompanhar - ou comboiar, como quiserem - a fase final do mandato do atual Presidente da República, temos de saber escolher e apoiar o próximo Presidente da República". Quarenta e cinco (45) anos depois, Balsemão, quis demonstrar ao presidente Marcelo que não está “Lelé da cuca” e que até está disposto a “comboiar” com ele, nesta fase final do seu mandato, embora lamentando “que o Presidente não consiga afinar o Governo.” Este apoio é enternecedor. É certo que este apoio foi prestado em vídeo especificamente dirigido aos militantes do PSD, a propósito dos 49 anos de existência do partido, o que desvaloriza um pouco o alcance do mesmo, porém, não deixa de não ser um apoio ao presidente Marcelo e de onde (certamente) este menos esperava. Estará agora Balsemão “Lelé da cuca”? Provavelmente sim, mas agora também não admira. Em todo o caso, o presidente Marcelo precisa do apoio de toda a sua parentalidade política, mesmo daqueles que só por afinidade. Marcelo quis ser útil ao seu partido, mas este não “deixou”. Para além de ter o seu atual líder enredado em polémicas pouco gratificantes (mas rentáveis), tem um vice da bancada sob suspeita de corrupção ativa e passiva, prevaricação, abuso de poder e tráfico de influência, para além de outras figuras menores que teimam em desqualificar o partido. Não é por acaso que a extrema-direita continua a ganhar dividendos. Ela sente, que a sua «barriga de aluguer» está no PSD. Não foi, por isso, figura de estilo o parágrafo que Balsemão dedicou a esta matéria: “Não queremos nada com a extrema-direita. Lembram-se daquela canção brasileira Chega prá lá?”. Evidentemente que não estamos seguros disso. Não por Balsemão, que a idade poderá ter consolidado a sua ideologia de social-democrata de centro-esquerda, mas pelos restantes, aqueles que na amálgama partidária, ideologicamente vazia, colocam o partido bem longe do ideário político do seu fundador, Francisco Sá Carneiro.

E esses, estão por tudo!



([1]) - Marcelo Rebelo de Sousa, 05 de agosto de 1978, secção Gente, semanário Expresso

sábado, 6 de maio de 2023

 MONTE

Negro

Diz o ChatGPT, que “monte”, pode significar um grande número ou quantidade de algo, como eu "Tenho um monte de livros para ler antes do fim do semestre” ou, digo eu, “Eu tenho um monte de pisos na minha casa.” Na versão mais académica, “monte” significa uma elevação de terreno, uma colina ou uma montanha. Seja como for e em quaisquer dos casos, “monte” significa quantidade em sentido próprio e/ou impróprio. Quando por exemplo dizemos, “eu tenho inveja do líder do psd pelo “monte” de pisos que tem a sua casa” ou o “monte” de casas de banho, é evidente que aqui estamos a dar relevo à quantidade (“monte”), o que num país pobre e endividado, é obra. É claro que o “mérito” aqui tem o seu papel. Só é possível fazer omeletes sem ovos, se estivermos a pensar nos ovos alheios. E aqui está a habilidade, meritória, dirão alguns. Não sigo exatamente estes que o dizem, pois para mim gosto mais do anúncio televiso de outrora: “Palavras para quê? É um artista português”. Em outros episódios conhecidos, recentes, o líder do psd já tinha mostrado virtualidades para criação de “montes” de dinheiro, na verdadeira aceção de “elevação” do seu património pessoal, baseado em fenómenos de natureza eruptiva, associados à extravasação da sua “influence”, junto de entidades públicas de natureza regional ou local. Meritocracia, propalam os "compagnon de route". Como disse, acho que a coisa é mais “chã”. Contudo, contrariamente ao “monte branco” ("Mont Blanc") que é límpido e cristalino, o “monte negro”, deve a sua elevação (patrimonial), ao engenho humano. Talvez por isso, não seja branco, mas negro. Negro de escuro, sem transparência, opaco e dissimulado. O monte negro é a antítese do que se exige de um político que aspira a governação de um país. Ou seja, nas palavras do presidente Marcelo, falta-lhes capacidade, confiabilidade, credibilidade, respeitabilidade e autoridade. Isto é muito mau, porque deixa o presidente “à coca” …

sexta-feira, 5 de maio de 2023

“CONVERSA EM FAMÍLIA” – PARTE II

O presidente Marcelo, que não o do Conselho, mas o da República, reativou ontem, sem pompa e circunstância, um programa televiso existente nas vésperas de Abril, de comentário político outrora apresentado por Marcello Caetano, então Presidente do Conselho de Ministros de Portugal.

Na sua comunicação de ontem, inopinada e belicosa, o presidente Marcelo, em linguagem meio-cifrada, pareceu indiciar que doravante tornará público o veto presidencial ao nome indicado pelo primeiro-ministro, para ministro ou outro cargo público, sempre que no seu entender, a personalidade escolhida pelo primeiro-ministro padeça de “capacidade, confiabilidade, credibilidade, respeitabilidade e autoridade”, para o cargo. Até aqui, disse o presidente Marcelo, estas questões com maior ou menor dificuldade eram resolvidas pelos dois (“acertar agulhas”), no segredo das reuniões institucionais, realizadas para o efeito. E avisou o primeiro-ministro, que não há “razões de consciência pessoal”, para não afastar um ministro, “…quando o que está em causa é a responsabilidade política e administrativa essencial para que os Portugueses acreditem naquelas e naqueles que governam.” E termina este primeiro capítulo do monólogo, dizendo o seguinte: “Foi pena. Não por razões pessoais ou de disputa entre cargos que a Constituição distingue muito bem entre si, em termos de peso institucional, absoluto e relativo.” Desta “Conversa em família” – parte II é possível extrair duas conclusões: a primeira é que o episódio triste e lamentável do assessor do ministro e da reação deste às alegadas notas e ao furto do portátil é de importância escassa comparado com outros furtos bem mais grave como, por exemplo, os milhares de cópias de documentos desviadas do ministério da defesa, na época do Governo PSD/CDS-PP, que não mereceu a amplitude que a este caso foi dado. Percebe-se: o presidente Marcelo e a sua parentalidade política viu aqui uma oportunidade soberana para reverter as regras da democracia e mandar este governo abaixo. “A ocasião faz o ladrão”, lá diz o ditado. Por outro lado, a indigitação de João Galamba, para ministro das Infraestruturas, desde a primeira hora, foi vista pelo presidente Marcelo com bastante desconfiança e desconforto, chegando mesmo a transmitir a ideia que responsabilizaria o primeiro-ministro pelo que viesse a suceder em resultado da remodelação; a segunda é que este episódio obrigou o presidente Marcelo a reposicionar-se no xadrez político/constitucional, o que o deixou deveras incomodado a tal ponto que no monólogo sentiu necessidade de dizer, que a sua discordância quanto à manutenção do ministro das Infraestruturas, nada tinha a ver com “… razões pessoais ou de disputa entre cargos que a Constituição distingue muito bem entre si, em termos de peso institucional, absoluto e relativo.” (sublinhado nosso). Esta é a grande frase do monólogo. E, de facto, a culpa é do primeiro-ministro que, durante quase 7 anos, deixou que se criasse a convicção que a governação era bicéfala, primeiro-ministro/presidente da república. Mas a política é isto. A conveniência de uns pode ser a desgraça de outros. Assim, vamos ter de esperar por nova “Conversa em família” – Parte II, em data a anunciar, certamente, para substituir o “fusível” (palavra do presidente), no disjuntor.

quinta-feira, 4 de maio de 2023

EM PORTUGAL O SISTEMA DE GOVERNO NÃO É PRESIDENCIALISTA

Marcelo sabia-o. Esticou a corda, com se costuma dizer.

O estilo de presidente populista que Marcelo encarna, rapidamente foi apreendido por Costa que foi deixando que se criasse em alguma opinião pública e publicada a ideia de que o governo era bicéfalo, ora governava Costa ora governava Marcelo, este último intervindo com a permissividade (calculista?) do primeiro-ministro. E assim se venceu um mandato presidencial, em que a maioria dos seus parentes políticos desesperava com tanta coabitação amigável. Marcelo, sentia-se bem nesse papel. Olha faz isto, olha faz aquilo, olha faz aqueloutro. E Costa (aparentemente), fazia. Já não se estranhava. Todos assimilaram que sendo Marcelo um «bicho carpinteiro» e de «megafone» em punho, seria muito difícil se não impossível, esperar que ele não se imiscuísse na governação. Costa já sabia, muito antes de ser primeiro-ministro. E foi deixando que tal acontecesse, muitas vezes, até, lançando o isco a Marcelo que este inadvertidamente “mordia”. A maioria absoluta do PS, em resposta à dissolução da Assembleia da República, por ele apressadamente decretada, foi um rude golpe na sua credibilidade política, acentuada pela derrota estrondosa do seu delfim, à presidência dos sociais-democratas. E ele sabia que seria desastroso para o seu segundo mandato, uma maioria absoluta (inimaginável) a Costa e Rui Rio na presidência do PSD. Começava o calvário. De um momento para o outro, toda a sua exagerada intervenção política, transformava-se em pesadelo. O descrédito político estava em marcha e a população mostrava cansaço de tanta intervenção do presidente, ineficaz. Já não havia coragem para apoiar abertamente o presidente Marcelo. Só que, como ele chegou a dizer, «…não iria ficar quieto e calado…», isto a propósito das infelizes declarações sobre a pedofilia na igreja católica. E não ficou, apesar de ter estado em «modo de silêncio» durante alguns dias. Começava o ano de 2023 e Marcelo empreende uma nova estratégia para desgaste do governo com vista à queda do mesmo. Renovam-se as esperanças na parentalidade política e todos, sob a batuta do presidente, ampliam os factos e situações que a governação direta ou indiretamente ia criando e que o presidente ia “fabricando´´. Tudo começa com o convite ao presidente Lula para participar nas comemorações do 25 de Abril, que se dizia da autoria do ministro dos negócios estrangeiros João Cravinho e que o presidente sabendo que foi ele o autor do convite deixou que, até às vésperas das comemorações, se vilipendiasse quer o ministro quer o próprio governo, numa atitude de todo censurável. Depois veio o caso TAP, finalmente de alívio presidencial que volta ao combate desta vez para em surdina levar à demissão do anterior ministro das infraestruturas, o que conseguia. Porém, fica de novo furioso, quando Costa escolhe João Galamba, para o cargo. Disse-o, logo na tomada de posse. Seguiu-se a pedofilia na igreja católica, terreno totalmente incómodo para o presidente que, em seu socorro, chegou a chamar por Passos Coelho, o que deixou este furibundo e mostra o quão “perigoso” é Marcelo, em desespero. De novo vem ao de cima João Galamba, através da exoneração do seu assessor, que decidiu levar consigo um portátil que lhe estava atribuído, não sem antes, se envolver em atos de vandalismo, que levaram à intervenção de autoridades policiais. Estes fatos, inqualificáveis, diga-se, levaram a parentalidade política e o presidente Marcelo a exigir a António Costa, a demissão do ministro. Toda a opinião pública e a publicada estavam absolutamente convictos que não havia alternativa para António Costa. O governante pede a demissão e o primeiro-ministro não a aceite. Uma calamidade. O presidente imediatamente manda um comunicado a dizer que “discorda da decisão de António Costa”. Está instalada a crise entre estes dois órgãos de soberania.  Marcelo ficou sem trunfos. Resta-lhe a “bomba atómica”. Um facto, porém, parece fazer recuar a impetuosidade presidencial. Os resultados económicos do país e a execução do Plano de Recuperação e Resiliência. Serão estes fatos suficientes, para afastar o desejo liquidatário do presidente? Pessoalmente, penso que não. Veremos