O debate está aí, de novo!
Desde 2017, com votação negativa na AR, em maio de 2018, que a questão da despenalização da eutanásia em Portugal tem sido tema de debate com diversos matizes. Naquela época, o debate centrava-se na questão essencial, ou seja, a dimensão ética da eutanásia a qual se dizia não cabia em princípios gerais, como o da simetria ou o da diferença moral.
hoje o debate político sobre esta matéria não tem qualidade. Aqueles que foram os grandes vencedores da rejeição da lei da despenalização na AR, em 2018, são os mesmos que agora defendem a realização de um referendo, exatamente com o argumento de que a AR não tem legitimidade para legislar sobre esta matéria.
O debate agora é esquerda/direita. Ou melhor esquerdas/direitas e extrema-direita. E a igreja católica, claro!
Esta, pela voz do secretário da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), no final da reunião do Conselho Permanente, disse que o referendo, "embora a vida não seja referendável", pode ser, nas atuais circunstâncias, uma forma "útil para defender a vida no seu todo, desde o princípio até ao seu fim natural".
Claro que esta posição não é mais do que “empurrar com a barriga para a frente”. Adiar é o lema!
Nesta segunda investida legislativa sobre a eutanásia, ouvem-se slogans do tipo “não matem os velhinhos”, o que denota uma ignorância só comparável àquela que dizia “que os comunistas comiam criancinhas”.
A questão central, porém, permanece. Deverá ou não ser permitido aos cidadãos em certas circunstâncias pôr termo à vida? Deverá ou não ser permitido aos cidadãos em certas circunstâncias ter uma morte assistida?
Partindo da perspetiva filosófica de que a morte é uma dimensão da existência humana, já que somos finitos e mortais, temos o direito não apenas de viver de modo digno, mas também o direito de morrer com dignidade, sem sofrimento ou sem um prolongamento artificial do processo de morrer (distanásia). Isso, porém, não nos dá o direito de abreviar a vida (eutanásia). Ou dá?
Temos o direito não apenas de viver de modo digno, mas também o direito de morrer com dignidade. Entre o não abreviar e o não prolongar está o cuidar com arte e humanidade, ou seja, garantir a morte em paz e sem sofrimento (ortotanásia), proporcionada pela prática dos cuidados paliativos.
Quer isto dizer, portanto, que a eutanásia pode ser defendida ou rejeitada a partir das suas consequências. No primeiro caso, defende-se a eutanásia porque ela tem a consequência de minimizar o sofrimento; no segundo, rejeita-se a eutanásia porque ela tem a consequência de diminuir a confiança nos profissionais de saúde.
A despenalização e regulamentação da morte medicamente assistida em Portugal, tem de considerar que as pessoas em pleno uso das suas faculdades mentais, mas perante um sofrimento profundo ou uma doença incurável, devem ter liberdade de escolha, ou seja, liberdade para decidir morrer. O tema da eutanásia e do suicídio medicamente assistido tem de ser enquadrado no plano da consciência individual precisamente por ser uma decisão profundamente íntima e pessoal na qual o Estado não tem direito a intervir.
Para Laura Ferreira dos Santos, autora de vários livros sobre esta matéria, e fundadora do movimento "Direito a morrer com dignidade" defende ainda que, sendo esta uma questão que se coloca no plano pessoal, não pode nem deve ser decidida por Referendo uma vez que não é à maioria que cabe decidir algo tão intimo e profundo como decidir morrer.
Esta autora e bem, considera que, tal como o direito à vida, o direito à morte é um direito fundamental.
No próximo dia 20 de fevereiro vão ser debatidos e votados (espera-se) no nosso Parlamento, cinco projetos de lei para despenalizar a eutanásia. As diferenças entre eles são poucos, tendo em comum, porém, o deixar de fora menores e pessoas incapazes.
Espera-se que Portugal, á semelhança do que aconteceu em Espanha, na semana passada, reponha o quadro de direitos a todos aqueles que pretendem morrer com dignidade, sem sofrimento ou sem um prolongamento artificial da vida.
Também este é um direito inalienável.