segunda-feira, 6 de abril de 2015

A PESCADINHA DE “RABO NA BOCA”

Quando em 2011, mais propriamente, em 05 de Junho, se realizaram as eleições legislativas, elas foram um culminar de vários factos políticos marcantes, entre os quais se destacam, o chumbo do PEC IV apresentado pelo governo minoritário do PS, pela maioria PSD, CDS, BE e PCP.
Esta maioria de dois blocos (PSD/CDS) e (PCP/BE) que se uniram para derrubar o governo minoritário do PS, tinham ambos por objetivo forçar Portugal a submeter-se a um programa de ajuda financeira e, consequentemente, a permitir e a reclamar a intervenção das instituições internacionais no nosso país através da chamada tróica.
Mas se é verdade que os dois blocos (PSD/CDS) e (PCP/BE) se uniram para o derrube do governo do PS e consequentemente forçarem a intervenção externa tudo indica no entanto que os objetivos de cada bloco eram (aparentemente) diversos. Para o bloco (PSD/CDS), era uma oportunidade de irem para o governo executar o programa internacional de ajuda, mostrando-se totalmente disponíveis para, se fosse caso disso, irem para além do que estava inicialmente programado pelas referidas entidades internacionais. Pelo contrário, para o bloco (PCP/BE), era uma oportunidade de forçarem Portugal a sair da União Europeia ou, numa primeira fase, apenas uma saída da zona euro, criando-se uma situação tipo Argentina com as especificidades, no entanto, da parceria monetarista, em que estávamos envolvidos. Em qualquer caso “um tiro no escuro” e de consequências totalmente imprevisíveis. Era a velha teoria “quanto pior melhor.”
Para o outro bloco (PSD/CDS) filhos e parentes de ajudas anteriores e funcionários partidários recrutados para empresas dos “barões” desses partidos, cumpria-se o desígnio partidário de executar o programa de ajuda financeira traçado para Portugal, em condições de total sintonia e submissão aos mentores da “ajuda”, em particular às diretivas e determinações interligadas à condição de “bom aluno”.
Entretanto, cumprido o objetivo dos dois blocos, estes desfizeram-se indo cada um para seu lado. Os do “pote”, a ele se mantiveram e mantêm ligados, gerindo a “coisa pública” como “coisa sua”, criando nos seus membros e na maioria que os sustenta uma verdadeira cultura de irresponsabilidade e impunidade, tornando decisões irrevogáveis em revogáveis, sendo devedores relapsos de impostos ou contribuições, desviando fundos europeus para atividades entretanto falidas ou insolventes, tornando o Sistema Europeu de Transferência de Créditos (ECTS) das universidades que frequentaram, em verdadeiros sistemas tóxicos, que geram a nulidade ou anulabilidades das respetivas licenciaturas, promovem os negócios próprios ou dos amigos que os sustentam, recusam a paternidade e a homossexualidade bem como a adoção por casais de mesmo sexo, mas beneficiam da proteção desses grupos minoritários que envergonhadamente a eles pertencem, presenteiam os filhos dos seus “patrões”, com lugares no aparelho da administração pública, seja, local, regional, central ou deslocalizada (institutos, empresas públicas, etc.), são produto do obscurantismo e primos do assistencialismo serôdio e primário, são fazedores de pobres e de cantinas sociais, são os medíocres de hoje e os “homens/mulheres de palha” do capitalismo de casino, espelho vivo da sociedade portuguesa atual.
O bloco do “quanto pior melhor”, rapidamente se deu conta que as suas teses não tinham seguidores. O abismo era situação que os portugueses não queriam experimentar. Tornou-se, por isso, “ um peso morto” na política nacional. Não tardou a desfazer-se e a fragmentar-se.
Resta o PS, mas para fazer radicalmente diferente.
Os blocos estão construídos e têm as suas lógicas próprias, ainda que alguns deles se vão deteriorando o que inevitavelmente acontecerá com o outro. A diferença, está pois, num PS robustecido, programaticamente diferente e sociologicamente mais próximo dos ideais de Abril. O PS tem de se apresentar ao eleitorado, com um partido pronto para protagonizar a mudança num país que sofreu o maior empobrecimento da sua história. O PS tem de ser capaz de fazer diferente e melhor, que o mesmo é dizer, tirar da pobreza e da miserabilidade milhares de portugueses arrastados pela austeridade impiedosa e desumana aplicada pelo atual governo, a troco de uns “patacos”, para o relançamento dos grupos financeiros.

Se não houver uma política totalmente diferente, seja na saúde, educação, justiça, trabalho, na defesa dos direitos dos mais jovens e dos mais idosos, na proteção social, na maternidade, na retoma urgente das três refeições mínimas para as crianças, na proteção efetiva aos mais idosos e reformados, na integração gradual das pessoas na sociedade e repúdio aos guetos, na defesa da igualdade de género, na proteção às minorias e estabelecimento de direitos iguais, em síntese, na criação efetiva de uma sociedade mais justa, solidaria e fraterna.

Estes são valores que estão no ADN do Partido Socialista e que de novo são chamados ao poder.

Cabe ao PS, de vez, pôr termo à “pescadinha de rabo na boca”!...


quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

“AS MORTES DESNECESSÁRIAS”

Sobre o assunto em título e com arrepiante singeleza o Bastonário da Ordem dos Médicos avisa que os últimos casos noticiados «não são os primeiros», nem deverão ser os últimos.
Vem isto a propósito, como sabem, dos dois casos recentes de doentes que acabaram por falecer após aguardarem várias horas por assistência médica nas urgências de dois hospitais e que o Bastonário da Ordem dos Médicos afirma que são consequência das medidas de austeridade impostas pelo Governo.

Segundo o Bastonário, o Ministério da Saúde deve assumir a responsabilidade por estas “mortes desnecessárias”, relacionadas com o facto de “os doentes não serem atendidos no tempo devido em consequência das medidas de cortes cegos, de asfixia financeira dos hospitais, da ausência de autonomia dos hospitais”.

Ora, é justamente neste ponto que entendo que se deverá confrontar o ministro da Saúde, naquilo a que vulgarmente se chama de “responsabilidade política”.

Não é aceitável que a impunidade dos atuais governantes, vá ao ponto de por ação ou omissão, se criarem “mortes desnecessárias”. Estes comportamentos são verdadeiros atentados ao valor da vida humana e significa uma desproteção inadmissível do bem jurídico mais valioso, consignado na Constituição da República Portuguesa.

O ordenamento jurídico, o direito, encara a proteção da vida como uma das suas funções axiais ([1]) . Ilustrativa é a circunstância de, entre nós, a Lei Fundamental indicar como direito fundamental primeiro que “a vida humana é inviolável” (art.º 24.º, n.º 1, da CRP).
Desta forma, a tutela do indivíduo constitui também o núcleo central do bem jurídico protegido pelos crimes contra a humanidade. Também ao nível internacional se tutelam bens jurídicos individuais – a vida humana, a saúde, a liberdade…– em situações de ataque maciço ou sistemático, realizados pelo próprio poder político ou organizações que dominem esse poder.
Ora, as denominadas “mortes desnecessárias”, fruto “… das medidas de cortes cegos, de asfixia financeira dos hospitais, da ausência de autonomia dos hospitais”, têm que ser assumidas como verdadeiros crimes contra humanidade, na medida em que violam também o núcleo central dos bens jurídicos individuais, a vida humana, a saúde, etc., etc..

Deixar morrer doentes nas salas de espera dos hospitais ou nas macas dos bombeiros por falta de intervenção atempada dos serviços de saúde, por negação de meios, asfixia financeira ou cortes cegos e outros, tem o mesmo significado (e objetivo) que deixar morre à fome mais de vinte mil crianças, ou colocar cerca de 28,6% das crianças em risco de pobreza ou cerca de 75,77% de pessoas sem qualquer rendimento ou pensionistas e reformados a receberem € 262,00 ou € 157,20 no caso de pensão de sobrevivência.

Todas estas condutas governamentais, são verdadeiros atentados aos direitos humanos, por violação dos bens jurídicos individuais, como a vida humana, a saúde e os direitos sociais e representam "lesões insuportáveis das condições comunitárias essenciais de livre realização e desenvolvimento da personalidade de cada homem" (Jorge de Figueiredo Dias).

Agora que se fala com alguma insistência, que o “país está a entrar num terreno perigoso, e pantanoso, em que são a justiça e os juízes a ditar as leis, por incapacidade e incompetência dos políticos” (António Costa, Diretor do Económico) ou, como refere o ex-bastonário da Ordem dos Advogados que alertou para o risco de se entrar numa 'República dos Juízes', será bom recomendar que as autoridades judiciais estejam atentas aos crimes diários que são cometidos pelas autoridades governamentais e que façam uso do seu poder, para por cobro a tais comportamentos.

O povo Português no momento próprio, não deixará de politicamente punir severamente estes governantes atuais. Porém, o mal está feito e se assim continuar será dificilmente reparável.

Por isso, hoje como sempre, é absolutamente intolerável que se aceitem impunemente as “mortes desnecessárias”.

Os seus responsáveis políticos têm de ser obrigados a assumir as suas responsabilidades já que não têm (tiveram) a coragem de o fazer voluntariamente.

Se há alguma coisa “desnecessária”, ela é mesmo (entre outras, naturalmente!...) a incompetência ministerial.








[1] Inês Fernandes Godinho, “PROBLEMAS JURÍDICO-PENAIS EM TORNO DA VIDA HUMANA”

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

“A APANHADORA DE BIVALVES”

Numa lamentável falta de ética democrática e republicana a ministra da justiça chutou as suas responsabilidades no caos da justiça, citius, tribunais, processos, etc., etc., para o mexilhão, nestes caso, ao que parece, para dois mexilhões, por ela recrutados, em 2012, à polícia judiciária. Para esta ministra, que, com a conivência do ministério público, põem a circular a ideia que o caos na justiça foi sabotagem de dois mexilhões, perdão, de dois informáticos da judiciária. É simplesmente vergonhoso.
Como vergonhoso é que a ministra de justiça (ao que se diz) sugira ao ministro da educação que recorra ao Conselho Superior da Magistratura, para que este nomeie um magistrado que avalie dos prejuízos causados aos professores, alunos, pais, pela falta de abertura de aulas em tempo útil, e do caos que se instalou na educação, não tenha a mesma decência de utilizar para si e para o seu ministério, o mesmo principio que venha a responder pelos prejuízos causados aos profissionais do foro, às populações e a todos aqueles que se viram afetados pelo caos que se instalou na justiça por via da teimosia ignorante e autocrática da ministra da justiça.
Neste ponto, aliás, vale a pena chamar à colação o regime jurídico do artigo 500.º do Código Civil (“Responsabilidade do comitente”). É muito interessante verificar que a incompetência e os factos danosos ainda que incondicionalmente praticados pelos ministros, designadamente, o da justiça e da educação, gerem prejuízos sérios aos profissionais e às populações e o que estes “comissários “ fazem é transferir para o Estado (comitente) a responsabilidade de indemnizar. Basta de impunidades.
Estes dois ministros devem responder civil e pessoalmente pelos prejuízos causados. Repete-se, chega de impunidades.
Nem vale a pena chamar a atenção para a responsabilidade política. Essa, com este governo e com esta maioria, não tem qualquer valor ético e deontológico e é por isso, democraticamente nulo, ou “irrevogável”, com se queira!...


terça-feira, 7 de outubro de 2014

"PENSADO E DISCUTIDO"

“Reforma do mapa judiciário é tranquila”
01 de Setembro de 2014 (Lusa)
Paula Teixeira da Cruz


Volvidos mais de 40 (quarenta) dias sobre a propalada reforma da justiça, na vertente da implementação do “novo” mapa judiciária, a verdade é que esta reforma ficará para a história, como o maior flop na reorganização judiciária, pelo menos, de há 200 (duzentos) anos a esta data. E isto, apesar da ministra da Justiça Paula Teixeira da Cruz assegurar que o novo desenho judiciário foi muito "pensado e discutido", “com 23 comarcas e novos modelos de gestão com objetivos, sob "escrutínio público".

A ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, garantia que a reorganização judiciária, que entrou em vigor em 01-09-2014, era "…uma reforma tranquila", refutando muitas das críticas que até então tinham sido feitas ao novo mapa judiciário.

Para a ministra da Justiça "há 200 anos que não se fazia uma reforma" na Justiça tão "pensada e discutida" e que "o decreto-lei [que esteve na sua origem] esteve nove meses no parlamento", acrescentando que a nova organização judiciária "foi, talvez, das reformas mais participadas, e que continua a ser monitorizada".

A ministra reiterou que o novo mapa judiciário assegura maior especialização da Justiça para o interior do país e refutou que haja populações que distem "mais de 59 quilómetros do novo tribunal".

"A distância maior face ao que existia é de 59 quilómetros. Foi tudo equacionado em termos de transportes e até medido o tempo para percorrer a distância", acentuou, lembrando que "havia tribunais em que o juiz só ia lá de 15 em 15 dias".

Aludiu ainda ao aumento dos DIAP (Departamento de Investigação e Ação Penal), que passam de seis para 14, com a criação daqueles departamentos em Faro, Leiria, Viseu, Santarém, Braga, Madeira, Açores e Lisboa Norte (com sede em Loures).

A ministra recusou a afirmação de falta de condições dos contentores em que funcionam, a partir de hoje, os tribunais de Loures, Faro e Vila Real.

"Os contentores não são contentores, são módulos, devidamente apetrechados, que até têm celas. Ouvimos hoje os presidentes das comarcas dizerem que estava bem e que até tinham melhores condições agora", disse.

Admitindo que há insuficiência de funcionários judiciais - disse que a portaria para concurso público de recrutamento já está publicada.

Todas estas afirmações foram produzidas pela ministra da Justiça antes e depois da entrada em vigor do diploma legal (01-09-2104) e reiteradas sucessivamente por ela, ainda que o caos se estivesse instalado logo a partir do primeiro dia de Setembro.

A ministra da Justiça, que ao que dizem, não ouve com quem ela fala, foi por diversas vezes alertada para  "as condicionantes subjacentes ao sistema informático Citius", mas a sua teimosia na entrada em vigor do novo mapa judiciário em 01 de setembro, fez com que o sistema Citius, utilizado por advogados, magistrados e funcionários judiciais, bloqueasse no arranque da reforma, obrigando os operadores judiciários a voltar ao antigo sistema de papel. 

Situação que se mantem, até aos dias de hoje.

Foi preciso o coro de protestos de todos os lados, para que a ministra da Justiça, assumisse, pela primeira vez, em 17-09-2014, um pedido de desculpa pelos "transtornos e dificuldades acrescidas" causados pelas anomalias do sistema Citius.

Como se vê, ainda naquela data, quando o caos se encontrava totalmente instalado, com o Citius e os tribunais inoperacionais, os processos amontoados e perdidos nos corredores dos contentores ou dos tribunais, os operadores judiciários incapazes de trabalhar, sob que forma fosse, dizia a ministra da Justiça considerava esta questão como de "transtornos e dificuldades acrescidas".

Hoje (07 de Outubro de 2014), que a situação ainda não está resolvida, longe disse, e que os constrangimentos e condicionantes ao nível do Citius, se mantém também, foi tomada a decisão (em 02-10-2014), que já está sob a forma de lei, que estabelece que os "constrangimentos" na plataforma informática Citius constituem, desde 26 de agosto e até que estejam ultrapassados, um impedimento legal para efeitos de suspensão de prazos processuais.

Entretanto, milhares ou milhões de processos judiciais encontram-se com “paradeiro incerto” e a escassez (ou puro silêncio) de informação é gritantemente assustadora.
Cada um daqueles que têm responsabilidades perante terceiros, vai fazendo o que podem, justificando-se como podem, agravando os seus custos involuntariamente e sofrendo as consequências negativas de atos que não praticaram nem a eles deram causa.

Outros, porém, a começar pela ministra da Justiça, que têm as responsabilidades totais nesta matéria, mais que não seja em termos políticos, não assume a sua responsabilidade e demite-se do cargo que tão mal tratado tem sido.

E porque a ministra não se demite e o chefe do governo não tem a postura de Estado que se exige nestas situações, o que o obrigava a demiti-la, o que está para além da sua visão de Estado (vide que nem o dr. Relvas, ele conseguiu demitir), restava ao Presidente da República (garante do “regular funcionamento das instituições” democráticas), usar dos seus poderes constitucionais junto do chefe do governo, para que este tomasse a decisão que se impunha.

Nada disto foi feito e hoje o povo português passa pela vergonha de ver replicarem-se situações idênticas às da Justiça na Educação e em outros sectores da vida nacional, com enormes desconsiderações e falta de sentido de humanidade para um vastíssimo número de portugueses e suas famílias que se vêm à mercê desta maioria de incompetentes.

Este governo tem de ser demitido, não só por ser incompetente, “mas porque procura, com uma frieza arrepiante, atirar os portugueses do muro abaixo e simultaneamente retirar-lhes toda e qualquer rede de proteção.

Percebe-se, agora, porque é que Passos Coelho queria governar com a tróica. Na verdade, desde que a tróica saiu, ele e os seus ministros, criaram o caos das instituições, para além do empobrecimento generalizado da população.

Hoje é inquestionável que este governo pratica verdadeira violação constitucional do direito à justiça (e também à Educação), direitos estes fundamentais, e por isso, inscritos na Declaração Universal dos Direitos do Homem (vide artigos 7.º, 8.º e 26.º da Declaração).

Tal com aconteceu em outros países, é hoje claro que a responsabilidade deste governo e de alguns dos seus membros, com maior ênfase na Justiça e na Educação, vai muito para além da responsabilidade politica merecendo severa censura de âmbito civil senão mesmo criminal.

Haja coragem para o fazer, já que os tribunais já deram mostras de ser capazes de prosseguir e condenar a classe (alguma!!!) política.





É tudo uma questão de valor, não é?

Henrique Raposo, no Expresso online, de ontem (06-10-2014), diz que “Passos não é Sócrates: é por isso que está ferido.” Curiosamente, ontem também, veio a público que a ONG a que Passos presidiu e de onde somente recebeu “reembolso de despesas”, durante a sua presidência de 3 (três) anos, teve apenas um projeto concretizado: duas ações de formação na área da costura, para 29 formandas na Pedreira dos Húngaros. Por esta actividade intensíssima, não recebia vencimento, mas era reembolsado das despesas à razão de 5.000,00/mês (entre 1997 a 1999).

Ele há cada jornalista!...


A verdade seja dita, há uns que, por escritas da mesma natureza, receberam como prémio um lugar no governo, ainda que lhes tenham fracassado o briefing diário, mas lá continuam …

quinta-feira, 17 de julho de 2014

O croupier do “Casino Royal”

Devo recordar a quem me lê, que nos idos de 1990, Herman José foi autor e intérprete de um programa humorístico, denominado “Casino Royal”. Não é deste programa, porém, que aqui hoje vamos falar. É doutro, bem parecido, que resulta de um governo que instituiu a “fatura da sorte” como uma das “manobra [s] (mais) rasca [s] de quem concebe a sociedade como uma economia de casino e o Estado como instrumento dos mercados e promotor de raspadinhas.”
E a isto chamam, sem vergonha, promover a “cidadania fiscal”. ([1])

É este mesmo governo e a maioria que o concebe que “lava as mãos” do maior descalabro que se vem a verificar no sistema bancário português, não tendo a sensatez nem a preparação necessária para apreender que o descalabro do maior banco privado português “é sempre um assunto nacional, é sempre um assunto de Estado.”

Por outro lado, “a intervenção do Banco de Portugal [o croupier], sobretudo nos últimos três meses, foi absolutamente inconsequente e desleixada. Não é aceitável que se decapite a liderança de um banco, sem ter uma solução alternativa imediata.

Ao vetar nomes e soluções a conta-gotas, o Banco de Portugal gerou um vazio de poder sinistro e aterrador.

Os mercados sentiram a fragilidade, e desataram a vender, fugindo a sete pés da bolsa portuguesa.”([2])

Hoje que a solução está (aparentemente) encontrada, as desconfianças mantêm-se e continuam a minar a credibilidade do Estado Português, embora o governo tenha colocado com relativo êxito uma emissão de dívida a seis meses, com juros mais baixos, subindo estes, no entanto, nos bilhetes com prazo de um ano.

É esta contradição que assusta, pois é evidente, que estamos perante mercados especulativos que vão continuando a fragilizar as economias do sul, em particular, a portuguesa, por forma a criar um dependência insustentável quando a bolha rebentar.

Muita gente tem perguntado o que é que o regulador (leia-se BdP) andou a fazer durante este tempo todo, ou seja, desde as queixas apresentadas, no Verão de 2013, por entidades do universo financeiro, mas também do presidente da Semapa Pedro Queiroz Pereira, após várias denúncias a alertar para o facto de o maior banco privado, através da sua rede de retalho, estar a colocar dívida de sociedades familiares não financeiras, de que se desconheciam os riscos: ou seja, estava a usar os clientes para financiar as empresas do grupo.

Hoje é evidente que a atuação do BdP foi conivente e perniciosa aos interesses do país. Quase um ano de contínua degradação do tecido económico e financeiro português e de obscuros comportamentos protegidos e, em certa medida, perdoados, a troco de umas multas simbólicas, levam-nos a pensar que o “regulador” está comprometido com esta linha de atuação, quer no passado recente quer mesmo no presente, dos maiores bancos privados portugueses.

Veja-se, aliás, que Paulo Mota Pinto (what?), que está indicado para a presidência não executiva (chairman) do Banco Espírito Santo (BES), ao que se diz, vai também liderar o conselho estratégico. E, para que não haja confusões, diz-se que Ricardo Salgado e o primo José Maria Ricciardi são nomes apontados pela Espírito Santo Financial Group (ESFG) para integrar este órgão, que irá acompanhar a actividade e, ao mesmo tempo, pronunciar-se sobre as decisões estratégicas da sociedade.

Sejamos honestos: “tudo como dantes no quartel de Abrantes”!...



[1] .- “O que fica do que passa”, Henrique de Sousa, 18-02-2014
[2] .- “O Diário de Domingos Amaral”, 10-07-2014

segunda-feira, 9 de junho de 2014

A EXTENSÃO DO RESGATE SEM “ACLARAÇÃO”

Sem “aclaração” e sem qualquer aviso prévio, veio a tomar-se conhecimento pela imprensa, que o Governo está em diálogo com o FMI para pedir nova extensão do resgate e, desta vez, não será por razões técnicas. Tudo indica que o resgate já não vai ficar fechado a 16 de Junho, tal como previsto, segundo se diz “por motivos políticos.” O que é que isto seja, não interessa…!

Já em Abril de 2013, os países da Zona Euro chegaram a um acordo para permitir que Portugal e a Irlanda pagassem os empréstimos que estão a receber no seio dos resgates num período mais alargado. Nessa altura foi aprovada a extensão dos empréstimos por mais sete anos – com vista a facilitar o reembolso numa decisão que teve como objetivo retirar alguma pressão sobre as dúvidas relativas à incapacidade dos países pagarem os valores em dívida relativos a estes empréstimos. O que veio a ajudar, igualmente, o processo de regresso aos mercados de ambos os países, que então estava em curso. 

No caso português, houve luz verde informal dos ministros das Finanças europeus em Abril 2013 mas a decisão ficou dependente das medidas, entretanto já apresentadas, que compensassem o impacto da decisão do Tribunal Constitucional, que rejeitou as medidas que faziam parte do Orçamento do Estado para 2013. A luz verde formal só veio a ser dada em Junho, para que os países que tinham de levar estes casos aos seus parlamentos o fizessem.

Sensivelmente um ano depois volta Portugal a precisar de uma nova extensão do regate, desta vez alegadamente fundado em “motivos políticos”. Já se percebeu, porém, que a verdade é outra. Vejamos:

O resgate de Portugal foi assinado a 17 de Maio de 2011 e o Governo tem reiterado que terminou a 17 de Maio de 2014. Ainda assim, o Executivo pediu um prolongamento do período do programa por mais seis semanas, até 30 de Junho, argumentando que se trata de "uma extensão técnica" para "garantir tempo suficiente para avaliar o desempenho dos critérios de final de Março e completar a revisão final".

Ora, a realidade é que com o novo chumbo do constitucional, o tempo pedido anteriormente, já não chega para o estudo e aplicação das medidas alternativas às julgadas inconstitucionais que, diga-se, têm sido as mesmas de há três anos para cá.

Chega, por isso, a ser compulsivo o tique antidemocrático deste governo e da maioria que o sustenta, na afronta sistemática e sem quartel ao Tribunal Constitucional e por esta via à Constituição da República Portuguesa.

Aliás, as últimas considerações de Passos Coelho sobre o Tribunal Constitucional e sobre o perfil e escolha dos juízes desse tribunal são já um pré-inicio de uma insurreição sem quartel contra um dos órgãos de soberania mais importantes do Estado de Direito Democrático e, consequentemente, contra a própria democracia.

Por tudo isto, as "ameaças que pesam sobre o Estado de direito" em Portugal deveriam levar a União Europeia a reagir, mas a direita unida no Partido Popular, a Comissão Barroso e o presidente do Conselho, Van Rompuy bem como o Presidente do BCE, bloqueiam qualquer atitude, pois para estes é mais importante garantir o reembolso dos empréstimos feitos a Portugal, do que conter esta evolução progressiva e perniciosa da violação corrente dos valores fundamentais em Portugal. A união europeia é, pois, cúmplice da arrogância e autoritarismo do governo português.

Vejam-se as últimas declarações do comissário europeu dos Assuntos Económicos, Olli Rehn, que considera "algo frustrante" ser recorrentemente confrontado com questões sobre decisões do Tribunal Constitucional (TC) que forçam o Governo português a encontrar medidas orçamentais alternativas.

Também a este comissário ainda não lhe passou pela cabeça considerar “algo frustrante” o Tribunal Constitucional Português ser “recorrentemente” confrontado com normas repetidas e ostensivamente inconstitucionais, propostas por este governo durante três anos consecutivos.

Esta interrogação não questiona o comissário. E porquê? É Finlandês de memória curta…!