quinta-feira, 17 de julho de 2014

O croupier do “Casino Royal”

Devo recordar a quem me lê, que nos idos de 1990, Herman José foi autor e intérprete de um programa humorístico, denominado “Casino Royal”. Não é deste programa, porém, que aqui hoje vamos falar. É doutro, bem parecido, que resulta de um governo que instituiu a “fatura da sorte” como uma das “manobra [s] (mais) rasca [s] de quem concebe a sociedade como uma economia de casino e o Estado como instrumento dos mercados e promotor de raspadinhas.”
E a isto chamam, sem vergonha, promover a “cidadania fiscal”. ([1])

É este mesmo governo e a maioria que o concebe que “lava as mãos” do maior descalabro que se vem a verificar no sistema bancário português, não tendo a sensatez nem a preparação necessária para apreender que o descalabro do maior banco privado português “é sempre um assunto nacional, é sempre um assunto de Estado.”

Por outro lado, “a intervenção do Banco de Portugal [o croupier], sobretudo nos últimos três meses, foi absolutamente inconsequente e desleixada. Não é aceitável que se decapite a liderança de um banco, sem ter uma solução alternativa imediata.

Ao vetar nomes e soluções a conta-gotas, o Banco de Portugal gerou um vazio de poder sinistro e aterrador.

Os mercados sentiram a fragilidade, e desataram a vender, fugindo a sete pés da bolsa portuguesa.”([2])

Hoje que a solução está (aparentemente) encontrada, as desconfianças mantêm-se e continuam a minar a credibilidade do Estado Português, embora o governo tenha colocado com relativo êxito uma emissão de dívida a seis meses, com juros mais baixos, subindo estes, no entanto, nos bilhetes com prazo de um ano.

É esta contradição que assusta, pois é evidente, que estamos perante mercados especulativos que vão continuando a fragilizar as economias do sul, em particular, a portuguesa, por forma a criar um dependência insustentável quando a bolha rebentar.

Muita gente tem perguntado o que é que o regulador (leia-se BdP) andou a fazer durante este tempo todo, ou seja, desde as queixas apresentadas, no Verão de 2013, por entidades do universo financeiro, mas também do presidente da Semapa Pedro Queiroz Pereira, após várias denúncias a alertar para o facto de o maior banco privado, através da sua rede de retalho, estar a colocar dívida de sociedades familiares não financeiras, de que se desconheciam os riscos: ou seja, estava a usar os clientes para financiar as empresas do grupo.

Hoje é evidente que a atuação do BdP foi conivente e perniciosa aos interesses do país. Quase um ano de contínua degradação do tecido económico e financeiro português e de obscuros comportamentos protegidos e, em certa medida, perdoados, a troco de umas multas simbólicas, levam-nos a pensar que o “regulador” está comprometido com esta linha de atuação, quer no passado recente quer mesmo no presente, dos maiores bancos privados portugueses.

Veja-se, aliás, que Paulo Mota Pinto (what?), que está indicado para a presidência não executiva (chairman) do Banco Espírito Santo (BES), ao que se diz, vai também liderar o conselho estratégico. E, para que não haja confusões, diz-se que Ricardo Salgado e o primo José Maria Ricciardi são nomes apontados pela Espírito Santo Financial Group (ESFG) para integrar este órgão, que irá acompanhar a actividade e, ao mesmo tempo, pronunciar-se sobre as decisões estratégicas da sociedade.

Sejamos honestos: “tudo como dantes no quartel de Abrantes”!...



[1] .- “O que fica do que passa”, Henrique de Sousa, 18-02-2014
[2] .- “O Diário de Domingos Amaral”, 10-07-2014

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