quinta-feira, 3 de setembro de 2020

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Foi com estupefação que li que mais de 100 personalidades, entre as quais Cavaco Silva e Pedro Passos Coelho, subscreveram um abaixo-assinado pelo direito dos pais à objeção de consciência em relação à disciplina de Educação para a Cidadania. Ora, sendo a disciplina de Educação e de Cidadania, fiquei intrigado quanto aos conteúdos da Disciplina, e daí fui dar uma vista de olhos, e verifiquei o seguinte.

A Disciplina estÔ dividida em três grupos. Um primeiro grupo onde constam: (I) Direitos humanos; (II) Igualdade de Género; (III) Interculturalidade; (IV) Desenvolvimento SustentÔvel; (V) Educação Ambiental; (VI) Saúde. Estes domínios do primeiro grupo, são obrigatório para todos os níveis e ciclos de escolaridade.

Depois temos um segundo grupo, obrigatório em pelos menos dois ciclos do ensino bÔsico, com os seguintes domínios: (I) Sexualidade; (II) Media; (III) Instituições e Participação DemocrÔtica; (IV) Literacia Financeira e Educação para o Consumo; e (V) Segurança RodoviÔria e o Risco.

Finalmente, temos um terceiro grupo, com aplicação opcional em qualquer ano de escolaridade, onde constam: (I) Empreendedorismo; (II) Mundo do Trabalho, (III) Segurança, (IV) Defesa e Paz; (V) Bem Estar Animal e (VI) Voluntariado.

Ora, lendo este currĆ­culo da Disciplina “Educação para a Cidadania”, nĆ£o consigo entender o pedido de “objeção de consciĆŖncia”, por parte dos pais. Afinal estes pais e estas personalidades querem proteger as crianƧas de quĆŖ? Da absorção de conhecimentos que incluem a prevenção e combate ao discurso de ódio? da prevenção e combate ao trĆ”fico de seres humanos e direitos da crianƧa? Das questƵes como a identidade e gĆ©nero, o desenvolvimento da sexualidade, os direitos sexuais e reprodutivos - prevenção de relaƧƵes abusivas e a maternidade e paternidade - parentalidade responsĆ”vel? Ou serĆ£o as questƵes do Empreendedorismo, do mundo do Trabalho, da SeguranƧa, da Defesa e Paz ou do Bem Estar Animal e Voluntariado, que os incomoda?

Ɖ evidente que nĆ£o somos ingĆ©nuos e percebemos que as matĆ©rias da sexualidade e igualdade de gĆŖnero sĆ£o o “busĆ­lis” da questĆ£o. Como alguĆ©m escreveu, “E se estes domĆ­nios, que estĆ£o associados Ć  disciplina de Cidadania estivessem distribuĆ­dos ou implĆ­citos noutras disciplinas? (Alguns jĆ” estĆ£o). TerĆ­amos entĆ£o o direito enquanto portugueses de escolher os domĆ­nios que os nossos filhos devem ou nĆ£o abordar nas aulas?

ComentÔrio oportuno, sem dúvida.

Mas, o que Ć© mais surpreendente Ć© que em Portugal no passado distante ou recente nunca quaisquer pais ou personalidades defenderam o direito de “objeção de consciĆŖncia” quanto a disciplinas que violavam (aparentemente) os seus credos e/ou convicƧƵes. AliĆ”s, foi travada uma batalha dura e demorada para que Disciplinas que violentavam direitos constitucionalmente consagrados, passassem a ser opcionais.

Num trabalho publicado pelo CEDIS, da Universidade Nova de Lisboa, sobre a objeção de consciĆŖncia, vem dito que “… o direito de objeção de consciĆŖncia nĆ£o pode ser utilizado de forma arbitrĆ”ria, pois como vimos este direito pode gerar conflitos de igualdade, nĆ£o podendo funcionar como criador de desigualdades injustificadas que permitam a obtenção de privilĆ©gios de isenção de cumprimento de alguns deveres jurĆ­dicos. DeverĆ” tambĆ©m ser feita uma ponderação e um equilĆ­brio entre o direito do objetor e o direito da outra parte, devendo ser impostas medidas e deveres alternativos aos objetores que salvaguardem a imposição legal.”

Ora, o que estas personalidades pretendem nĆ£o Ć© o verdadeiro exercĆ­cio de objeção de consciĆŖncia, mas sim a apologia de "uma educação self-service", como escreve Carlos Alves, do “Observatório PolĆ­tico”. E Ć© preciso saber que "formar cidadĆ£os Ć© diferente de formatar cidadĆ£os". "Eu, eventualmente, atĆ© nem concordo com a lista de livros da disciplina de PortuguĆŖs, que se esquece de literatura portuguesa contemporĆ¢nea relevante, que Ć© brilhante, e insiste na lĆ­rica camoniana, mas a educação nĆ£o pode ser deixada Ć  mercĆŖ do 'bitaite' e da arbitrariedade, isso Ć© que Ć© contraproducente".

"Se vamos questionar o papel do Estado, então também podemos questionar a sua competência para fazer menus para as cantinas escolares. Também não tenho o direito de encher as artérias de gordura, certo?", conclui este autor.

Como diz PEDRO VAZ PATTO (O Desafio da Liberdade de ConsciĆŖncia, in Voz da Verdade, 2013), “A tutela alargada da liberdade de consciĆŖncia Ć© um desafio para sociedades livres, abertas e pluralistas, cada vez mais multiculturais, que respeitam as minorias e rejeitam a imposição de um qualquer “pensamento Ćŗnico”. Ɖ um sinal de autenticidade e maturidade de sociedades que se pretendem assentes na liberdade e dignidade da pessoa humana".

Omitir no currículo escolar matérias das sociedades atuais é empobrecer a cultura democrÔtica dos nossos jovens e dificultar-lhes a inserção neste mundo cada vez mais globalizado em que se derrubam diariamente barreiras e tabus.

Mas o mais curioso, é que estas personalidades para a fundamentação da sua objeção de consciência em relação à disciplina de Educação para a Cidadania citam, além da Constituição da República Portuguesa, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, nem de propósito matérias obrigatórias da disciplina de Educação para a Cidadania.

“Tem Pai que Ć© cego”!

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