sexta-feira, 26 de junho de 2015

Grécia (“O último Moicano”)

“Cora e Alice são filhas do comandante do Forte William Henry, escoltadas numa expedição pelos territórios inimigos até reencontrarem o pai. Esta é a parte ficcional do romance "O Último Moicano", de James Fenimore Cooper. As desventuras das duas raparigas e da sua escolta - traída pelo índio Magua, Raposa Matreira, chefe dos Hurões, que tenta assim vingar-se do pai das jovens, a expedição é salva pelo batedor Olhos-de-Águia e os seus amigos índios, entre eles, Uncas, o último dos Moicanos, filho de Chingachgook.”
O que tem esta história a ver, com o que se está a passar neste momento com a Grécia vs credores europeus e internacionais? Aparentemente nada. Porém, lá nas “profundezas”, parece existir um certo paralelismo, senão vejamos: Em primeiro lugar, há que admitir que o FMI por um lado e a Comissão Europeia e o BCE por outro lado são tribos que se opõem mutuamente, quanto ao tratamento e resolução do conflito grego, melhor se diria, do eminente incumprimento da Grécia.
Tal como no livro de Cooper, os leitores e eleitores (senão mesmo contribuintes europeus) ficaram tocados pela dualidade das versões apresentadas quanto à Grécia: a visão romântica do destino cruel dos gregos e a justificação histórica baseada na ocupação da Grécia pelo Eixo (Alemanha/Itália), durante a Segunda Guerra Mundial. 
É certo que o nosso Presidente da República (Aníbal Cavaco Silva), a propósito da Grécia, disse que a Grécia "não pode fazer aquilo que muito bem entende, porque ao fazê-lo vai prejudicar os outros". Adiantou até que a Europa não pode ceder a “chantagens”.
Ora estes comentários vindo de um Chefe de Estado que deixou que se humilhasse o seu país em visita oficial à República Checa (o então Presidente da República Checa, Vaklav Klaus disse na cara de Cavaco Silva que ficou "muito surpreendido por Portugal não parecer muito preocupado por ter um défice de oito por cento"), que nunca reagiu aos comentários dolosos quer dos Finlandeses, quer dos Holandeses, Alemães ou outros, sobre Portugal e os portugueses, que sempre serviu de capacho ou “bom aluno” aos interesses dos credores da economia de casino, arroga-se agora no direito de pretender humilhar o povo grego e o seu governo que, por muito criticável que seja, está no seu direito de dizer basta às arrogâncias dos credores internacionais e europeus.
Na União Europeia não vigora o princípio da solidariedade. Vigora o princípio do tratamento diferenciado.
A Espanha teve tratamento diferenciado de Portugal. A Irlanda, recebeu um resgate diferente do nosso. A Itália (tal como a Espanha ou a França), embora incumprindo em várias questões da zona euro, não admitiram ou aceitaram que fosse elaborado um programa de resgate tal como foi configurado para a Grécia, Portugal, Irlanda ou Chipre. E porquê? Por que estes, “são os outros”, os que fazem a diferença. São tão solidários como os países da Europa do Norte.
Não querem que se lhes entre em casa e muito menos que se diga o que têm a fazer.
Em Outubro de 2014, Manuel Valls (França) e Matteo Renzi (Itália) pedem mais tempo para reduzirem o défice, garantindo, em troca, fazer as reformas necessárias para que os seus países se tornem mais competitivos. Naquela altura pensava-se que se estava perante um verdadeiro desafio para um consenso sobre a austeridade na Europa, que poderia conduzir a resultados positivos. Treta!
Nem um ano volvido, quer a França quer a Itália, mantêm-se em deficit excessivo e não houve nem há qualquer “recomendação” tão drástica como aquela que se faz quase diariamente para a Grécia.
Pelo contrário, já em Novembro de 2104, a Comissão Europeia informava que não sancionaria a França, Itália e Espanha por não cumprirem as metas do deficit, na sua análise sobre os orçamentos nacionais de 16 países da zona do euro.
Além desta decisão, adotada pela Comissão, Bruxelas também decidiu não fazer recomendações específicas para cada um dos sete países que na altura corriam o risco de não cumprirem as metas, o que veio a acontecer.
Por outro lado, a Comissão recebeu os projetos de lei de orçamento nacionais em meados de outubro de 2014, com vista a propor alterações nos projetos de lei fiscal caso considerasse que não estavam de acordo com suas metas de deficit público (3% do PIB) e dívida (60% do PIB).
Porém, é curioso verificar, que Madrid conseguiu um adiamento até 2016 para que seu deficit cumpra os critérios europeus, embora as últimas previsões da Comissão Europeia, a Espanha terá um deficit de 4,6% em 2015 e de 3,9% em 2016.
Por outro lado a França e Itália são os casos que mais chamam a atenção. Paris e Roma foram no final de 2014 de novo à Comissão, para que ela lhes reenviasse o orçamento. Com esta “démarche”, Paris obteve, pela segunda vez, um prazo de dois anos, até 2015, para equilibrar seus gastos com os critérios comunitários. Mas o governo francês prevê um deficit de 4,3% para 2015 e um retorno à meta de 3% só em 2017.
E a Itália, embora cumpra a meta do deficit, não cumpre o critério da dívida pública, superior a 130% do PIB para este e para os dois próximos anos. No entanto, a Comissão decidiu colocar panos quentes sobre o tema adiando sua decisão sobre o incumprimento para 2015.
Entre os outros países "em risco de incumprimento" continuam a estar Portugal, Bélgica, Malta e Áustria.
Só a Alemanha, Irlanda, Luxemburgo, Holanda e Eslováquia têm leis de orçamentos convergentes com os critérios da zona do euro, enquanto Estônia, Letônia, Eslovênia e Finlândia apresentaram projetos de orçamento aceitáveis.
Os orçamentos de Chipre e Grécia não fazem parte do pacote já que estão sob assistência financeira e sob o controle constante por parte da UE.
As regras fiscais comunitárias defendidas por Alemanha mas questionadas por sua rigidez pelos países com maior desemprego que necessitam crescer não têm a aprovação unânime das organizações internacionais.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) criticou o rigor com que se aplica o Pacto de Estabilidade e de Crescimento europeu e, também, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) pediu maior flexibilidade nas regras fiscais da zona do euro.
Como facilmente nos apercebemos, é nesta luta sem tréguas e com muita hipocrisia à mistura que se desenvolve o ataque à Grécia e ao povo grego pelos detentores do capital em dívida na Grécia.
Tal como se passou com os “Moicanos”, povo nativo que foi arrancado das suas terras pela chegada dos brancos, também hoje se assiste à luta pela sobrevivência por parte do povo grego, sintetizada pela complexidade do sistema de denominação escolhida e praticado pelas instituições europeias e internacionais, que pretendem ver recuperados os seus créditos à custa do sacrifício e humilhação sem contemplações de todo um povo.
Alexis Tsipras, aparece-nos, assim, como uma espécie de o “Último Moicano”!...



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