A Secretária de Estado da
Modernização Administrativa, Graça Fonseca, assumiu em entrevista ao DN, no
passado dia 22 de agosto, que era homossexual. Fê-lo, ao que diz, por
considerar ser "importante" fazê-lo como "afirmação
política". Neste sentido, fez bem. As pessoas que estão em lugares de
poder podem contribuir, pela positiva, na desmistificação deste assunto, quando
se percebe que esta não é uma questão de privacidade mas sim e sobretudo uma
questão de identidade. Como refere a autora “a partir do momento em que se percebe que há questões de identidade que
ainda hoje são fundamento de ações violentas e discriminação, quando se pensa
sobre o que fazer - vou abrir ligeiramente a porta porque pode ter um impacto
positivo ou não vou abrir porque não é comigo - há um equilíbrio difícil.”
Outros, igualmente em lugares de
poder, já o tinham feito.
A sexualidade deve ser concebida
como direito que decorre da própria condição humana, que tem como suporte a
liberdade do indivíduo de se expressar e se relacionar sexualmente da maneira
que quiser. O direito à igualdade não pode ser condicionado à orientação sexual
do individuo.
“Quem pede direito ao reconhecimento pede que a distribuição da identidade
social não seja hierarquizante em função do traço de identidade específico.
Pede que todas as identidades sejam tratadas jurídica e politicamente como
equivalentes. Trata-se de afirmar o direito a ser diferente, e a que essa
diferença se torne irrelevante. É uma combinação de universalismo moderno e
iluminista, com pluralismo: reivindicação simultânea de universalismo e
percepção social de queer theory. A dissolução das identidades sexuais, a
afirmação de toda sexualidade, é feita em nome do universal. Rouanet (2001, p.
89) lembra que o universalismo é crítico justamente porque impede que as formas
paroquiais de pensamento e julgamento pretendam uma universalidade que não
podem ter. Assim, diz ele, quem defende o universalismo " condena o
sexismo, não por se identificar com o estatuto feminino particularista, mas por
negar a validade de todos os estatutos particulares e por considerar que esses
estatutos são quase sempre criações imaginárias, destinadas a privar os
indivíduos empíricos das suas prerrogativas como titulares de direitos
universais" (José Reinaldo de Lima Lopes, Sur, Rev. int. direitos
humanos, vol.2 no.2 São Paulo 2005)
Numa altura em que assistimos às
mais violentas violações dos direitos humanos, seja através do racismo mais
abjeto à xenofobia mais dilacerante, à castração dos direitos das minorias à
repugnante política dos muros e ao escandaloso comércio dos refugiados, é muito
importante que as questões de identidade que convivem paredes meias com as
questões mais vastas da dignidade humana sejam permanentemente escrutinadas,
para benefício de uma sociedade mais plural, tolerante e esclarecida. Isto
porque o ser humano deve ser visto como um fim em si mesmo e não como meio para
a proteção dos interesses de outrem.
Por essa razão, a dignidade da
pessoa pode ser bem expressa pela fórmula kantiana: o valor de cada ser humano, que não pode ser trocado por nada, não pode
ser comprado por nada e não pode ser instrumento de nada. Nenhum ser humano
pode ser usado por outro ou pela colectividade e não pode ser usado nem mesmo
como um exemplo, como um bode expiatório.
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