segunda-feira, 3 de junho de 2013

“PALAVRAS LEVAS-AS O VENTO”

No passado dia 26 de Setembro de 2012, a actual ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz), questionada sobre as investigações no âmbito de um inquérito crime às PPP's, afirmou que ninguém está acima da lei e que terminou o tempo de impunidade.
A ministra disse esperar que «o apuramento da responsabilidade vá até ao fim» na investigação que o Ministério Público (MP) está a fazer às Parcerias Público Privadas (PPP).
A ministra sublinhou ainda que «ninguém está acima da lei», que «tudo deve ser investigado» e que «acabou o tempo» em que havia «impunidade».
«Ninguém está acima da lei, sejam 'ex' ou actuais (...). É preciso que as pessoas entendam isso», reforçou.
As afirmações da ministra aconteceram depois de a Polícia Judiciária (PJ) ter efectuado buscas nas casas dos ex- ministros das Obras Públicas, Mário Lino e António Mendonça, e do ex-secretário de Estado Paulo Campos.

Embora muita gente estranhasse indignadamente estas afirmações da ministra, que inegavelmente extravasavam as suas competências e feriam os princípios da separação de poderes e da presunção da inocência, levando, inclusive, companheiros de partido da ministra a “considerar que fazer um julgamento em praça pública como está (estava) a acontecer com os ex-ministros das Obras Públicas e do ex-secretário de Estado demonstra falta de sentido de Estado.”, a verdade é que houve quem considerasse que tinha chegado o tempo da “caça às bruxas”.

Seja como for, e para que não restassem dúvidas, a ministra, agora em Outubro de 2012, volta a dizer, de forma enfática, que a "impunidade acabou mesmo".

Assim sendo, temos que admitir que a ministra mandou “às malvas” os princípios constitucionais supra citados, e está disposta a interferir (se é que já não o fez), nos poderes que não lhe pertencem, agora porventura mais à vontade já que não tem o anterior Procurador-Geral da República à perna, que se dizia “não lhe passar cartão”.

Mas se assim é, isto é, se a ministra assegura que a “impunidade acabou mesmo”, como é que explica o teor do despacho do Juiz Conselheiro da Secção Regional do Tribunal de Contas (TC) na Madeira, de Abril de 2013, que com a devida vénia, aqui se transcreve:
O juiz conselheiro João Aveiro Pereira afirma que o Ministério Público se coibiu “de acusar os governantes regionais indiciados pelas infracções financeiras que lhe são imputadas, não porque não haja factos e provas em abundância, que tornam os indícios fortes, indeléveis e não escamoteáveis, mas porque optou por uma linha de raciocínio divergente da realidade plasmada na auditoria e no respectivo relatório, eivado de conjecturas e ficções desarmónicas com o dever de objectividade e de legalidade por que se deve pautar a conduta processual do agente do MP”. E conclui que “só por distracção ou prefixação noutra solução, mais simples e divorciada da factualidade espelhada no processo de autoria, se justifica” que o Procurador Ventura Martins se tenha recusado a requerer julgamento dos responsáveis do governo madeirense por infracções cometidas em matéria de encargos assumidos e não pagos pelos institutos regionais da Saúde e Assuntos Sociais (IASAUDE) e do Desporto da Madeira (IDRAM), com omissão de dívidas num montante de cerca de 180 milhões de euros.
Ainda segundo o referido juiz conselheiro, "o Tribunal entende, e com sólida fundamentação, que foram cometidas as infracções", acrescentando que "o MP ignorou a responsabilidade financeira dos membros do Governo e mandou notificar apenas os restantes indiciados". Refere ainda ser "incompreensível" e "chocante" esta decisão de recusa do MP, não afastando, porém, "a possibilidade do julgamento vir a ser requerido, pois, a abstenção não tem efeito nem autoridade de caso julgado".
E se isto não bastasse para duvidar da bondade das palavras da ministra, quanto à enfática e estafada “morte à impunidade”, vejamos com reagiu a Procuradora-Geral da República, sobre este caso:
A Procuradoria-Geral da República (PGR) informou, em 30 de Abril de 2013 que decidiu ordenar uma inspecção urgente aos serviços do Ministério Público junto da Secção Regional da Madeira do Tribunal de Contas. "A matéria de que trata tal despacho mereceu, de imediato, a atenção da Procuradora-Geral da República", refere a nota publicada pela PGR na sua página da internet.

Contudo, acrescenta que "independentemente do que vier a ser apurado pela referida Inspecção relativamente à actividade do MP naquele tribunal", a Procuradoria "não pode deixar de anotar, também, o invulgar procedimento em que se traduziu a prolação de tal despacho, as diligências nele relatadas e a sua publicação nos jornais oficiais".

No comunicado, a PGR indica que no referido despacho são produzidas "um conjunto de considerações pessoais sobre o Estatuto do Ministério Público e a disciplina e gestão da carreira dos seus magistrados, sem correspondência no quadro legal, em qualquer uma das suas interpretações", que considera serem "pouco correctas".

"Tal procedimento não se afigura, também, formal e substancialmente, conforme com normas da Lei Organização e Processo do Tribunal de Contas e do Estatuto dos Magistrados Judiciais que regem quer o processo de auditoria e as diligências nele permitidas, quer a publicação dos relatórios e sentenças do Tribunal, quer ainda o relacionamento entre magistraturas", sublinha a Procuradoria.

Por esta razão, salienta que "irá também solicitar ao Presidente do Tribunal de Contas que, relativamente a essa situação, considere a possibilidade da averiguação e apuramento de eventual responsabilidade disciplinar do juiz conselheiro".

Ou seja, a PGR escolhida, talvez por “cautela de patrocínio” decidiu solicitar ao Presidente do Tribunal de Contas, que este verificasse da “possibilidade da averiguação e apuramento de eventual responsabilidade disciplinar do juiz conselheiro.”.

Ora ai está, o que vulgarmente se chama o princípio da anulação dos actos. Um Juiz detecta comportamentos eventualmente irregulares de um magistrado do MP, no âmbito das suas funções, denuncia tal comportamento para que se proceda às investigações necessárias, para por cobro (se for caso disso) a tais irregularidades e a entidade a quem cabe a investigação, que por acaso é a “entidade patronal” do dito magistrado do MP, responde com um pedido de averiguações da eventual responsabilidade do juiz conselheiro, denunciador, à “entidade patronal” deste.
Para a PGR escolhida, combate-se a «impunidade» desta maneira. Se fazem queixa dos “meus meninos” terei que pedir aos responsáveis dos “meninos” que fizeram queixa que averigúem também da eventual responsabilidade disciplinar destes, por terem feito queixa. Coisa, aliás, muito feia!...

A ministra, sobre este caso, preferiu estranhamente o silêncio. Mau sinal!

É que, entretanto, soube-se que o Gabinete da Luta Anti-fraude da União Europeia (OLAF) abriu uma investigação formal sobre o financiamento da empresa “Tecnoforma” e da “Organização não-governamental CPPC” (Centro Português para a Cooperação) com fundos comunitários, dando seguimento a uma queixa enviada pela eurodeputada socialista Ana Gomes em Dezembro último, referentes à «alegada má gestão ou fraude na aplicação de fundos europeus por parte da Tecnoforma, na altura em que Miguel Relvas ocupava o cargo de Secretário de Estado da Administração Local, e da ONG fundada pelo actual Primeiro-Ministro de Portugal, Pedro Passos Coelho».

Em comunicado, a PGR referiu que, em resposta a um pedido de esclarecimento de Pedro Passos Coelho, "correm termos dois inquéritos em segredo de justiça" às "actividades da empresa Tecnoforma", sublinhando que as investigações, "não correm, até à data, contra pessoa determinada"; a PGR acrescentou que um inquérito estava a ser investigado pelo DIAP (Departamento de Investigação e Acção Penal) de Coimbra e que outro se encontrava no DCIAP (Departamento Central de Investigação e Acção Penal).

Espera-se que a PGR escolhida dê continuidade às investigações, não sendo oportuna qualquer denúncia ou queixa contra a eurodeputada que subscreveu este pedido, até por que, este já se encontra no Gabinete da Luta Anti-fraude da União Europeia (OLAF) que, como é público, abriu uma investigação formal, para o efeito.

Só assim se evitará nova “palhaçada”, agora com outros protagonistas!!!